Ele escolheu o amor... |
O Dilema do Pavão
Esclareço que não
estou a referir-me aos pavões que podemos ver no Jardim Zoológico ou àqueles
que se passeiam vaidosos nos jardins dos palácios como elementos vivos de
decoração e exotismo.
Não, esses não se defrontam com
nenhum dilema, talvez tédio mas não dilema.
Apesar do seu mau feitio foi-lhes
roubada a liberdade e escolhidos para alindarem jardins. A troco,
garantiram-lhes a paz e a segurança das suas vidas sem lhes perguntarem se era
isso que eles queriam.
Claro que o homem não costuma
questionar-se quando interfere na natureza. Simplesmente serve-se a seu belo
prazer, põe e dispõe e só agora, tarde demais para muitas espécies para sempre
desaparecidas, tomou consciência das consequências dos seus actos para a sua
própria sobrevivência no longo prazo.
Era, pois, muito difícil, que aquela
ave com uma cauda que chega a atingir os dois metros e meio de comprimento,
ornamentada com desenhos e cores lindíssimas, pudesse passar despercebida e
deixada em paz no seu ambiente natural, lá pelas florestas da Índia, atordoando
os ares com os seus gritos estridentes avisadores de intrusos indesejados.
Quando os estudiosos dos fenómenos do
Evolucionismo reflectiram sobre aquela cauda que “conduz” os pavões direitinhos
para a boca dos tigres, seu principal predador, perguntaram-se como tinha sido
possível a uma espécie evoluir desenvolvendo um atributo - a sua longa cauda -
que era precisamente a razão da sua morte precoce.
Aquelas penas compridíssimas e
pesadas constituem um enorme empecilho quando pretende levantar voo, fazendo
lembrar um B 52 com os porões carregados a devorar a pista até ao fim para
conseguir pôr-se no ar com a diferença que não leva um tigre a correr atrás de
si.
Mas os problemas não acabam mesmo que
consiga elevar-se porque depois vai pousar num ramo e como é pesado não pode
ser um raminho qualquer e, das duas uma, ou fica a uma altura considerável do
chão ou o tigre vai buscá-lo armando um salto, eles que são gatos enormes
dotados de uma incrível agilidade, puxando-o exactamente pelas penas do rabo.
- Mas então, porquê?
- Não é a vida, seja ela de quem for, o principal valor a preservar na natureza?
- Então como é que
essa mesma natureza desenvolve na vítima as características que se transformam
em vantagens acrescidas para o predador?
Se pudéssemos voltar ao tempo de La Fontene , quando os animais
falavam, e ter com o pavão uma “conversinha” em particular o que ele nos
contaria, certamente, seria o terrível dilema em que a sua vida,
progressivamente, se transformou e explica o seu permanente mau feitio:
- Viver um romance de amor com a sua
amada e poder vir a ser o pai de futuros e lindos pavõezinhos ou acabar
estralhaçado na boca voraz de um tigre porque ela, a amada, lhe deu a perceber,
sem margem para dúvidas, que escolheria sempre para pai dos seus filhos os
machos mais lindos... os que tivessem uma cauda maior.
Entre garras do tigre e a amada ele, o pavão, escolheu o amor...
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