sexta-feira, março 06, 2015

Um nababo do cacau
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)





Episódio Nº 191















Num lugar que uma vez mostrei a vosmicê. Se lembra?

Enquanto o Coronel estiver contente com meus préstimos, sou homem seu. Tendo ouvido o que desejava ouvir, o Coronel respirou, aliviado. Ficara apreensivo com a notícia da construção da casa de Natário.

- Me lembro, compadre. Lembro muito bem, como havia de esquecer? Pois se falei nisso, foi para lhe dizer que não conheço homem mais direito do que o compadre. Quero que se saiba que tu nunca me faltou.

Presidia o almoço comemorativo do aniversário de dona Ernestina, sua santa esposa. Voltou a encher o copo com o espesso vinho tinto português. Fizera vir dois barriletes de Ilhéus tendo em vista aquele almoço que desejava não apenas abundante e saboroso: queria-o lauto e festivo.

 Para celebrar igualmente a presença do filho, recém-chegado do Rio de Janeiro. Sendo ele, coronel Boaventura Andrade, mais do que rico, sendo milionário, um nababo do cacau, andava ultimamente acabrunhado, de pouca conversa e pouco riso.

Dizia-se à boca pequena que a mágoa do Coronel era devida à ausência do filho único e doutor que se demorava na capital do país desde a formatura, já lá se iam cinco anos, longos e amargos.

Frequentando cursos e mais cursos, colecionando diplomas, especializando-se. Em quê o Coronel não conseguia descobrir: só se fosse em gastar dinheiro.

O Coronel elevou o copo em direção a Natário para brindar com o compadre, jagunço e capataz. Seu braço direito como escrevera certa feita ao Juiz de Itabuna, ao término das lutas pela posse das matas do rio das Cobras. Repetiu:

- Tu nunca me faltou.

Circundou os convidados com o olhar pejado de memórias:

- Por duas vezes tu me salvou a vida. A sua saúde, compadre!

Rosto estático, sentado na outra extremidade da mesa, Natário levantou-se, ergueu o copo - à sua, Coronel! - e em seguida o esvaziou, O silêncio ainda persistiu pois os comensais não sabiam se o anfitrião concluíra ou não a sua arenga.

Os comensais, pessoas de categoria, todas elas, conforme já antes se informou: o Juiz do Cível, de Ilhéus, e o Juiz de Direito, de Itabuna, esse acompanhado do Promotor e do Intendente; o doutor João Mangabeira, deputado estadual, ainda jovem mas já afamado pela inteligência; o coronel Robustiano de Araújo, da Fazenda Santa Mariana, o coronel Brígido Barbuda, da Fazenda Santa Olaia, o coronel João de Faria, da Fazenda Piauitinga, que lutara ao lado de Basílio de Oliveira em Sequeiro de Espinho, o coronel Prudêncio de Aguiar, da Fazenda Linda Vista, o coronel Emilio Medauar, árabe que além da Fazenda Nova Damasco possuía casa de negócio em Água Preta, um filho seu, Jorge, colega de turma de Venturinha, também trocava pernas no Rio de Janeiro, escrevia artigos nos jornais, publicara um livro de versos, que o pai, peidando e arrotando orgulho, exibia nas rodas de amigos.

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