sexta-feira, abril 10, 2015

Prof. Adriano Moreira


Estadista, político, deputado, politólogo, sociólogo, Prof. Universitário...





Noventa e dois anos de idade, 6 filhos, 14 netos, reformado há 22 anos e um poço de sabedoria acumulada ao longo de uma vida num cérebro brilhante.

Assim foi, ontem, o reencontro com o meu professor de há 56 anos quando, aos 20, entrei pela primeira vez na sala de aulas da antiga Escola Superior Colonial, ali ao Príncipe Real, em Lisboa, para a disciplina de Princípios Gerais de Direito, aproveitando o facto de ele ter aceite o convite da APRE, Associação de Pensionistas e Reformados, para vir a Santarém , à Casa - Museu Pedro Canavarro, proferir uma palestra.

Reencontro com o meu professor mas também reencontro com o passado. De repente, ali estava eu, sentado na carteira e à minha frente, de pé, o Prof. Adriano Moreira dando uma aula envolvendo-nos nas suas palavras como se não tivesse passado mais de meio século.

Como está, Sr. Professor? – Melhor do que o país – responde-me ele.

Sem dúvida, melhor do que o país relativamente ao qual ele sente uma genuína e muito sentida preocupação.

Quando o vi pessoalmente pela última vez ele tinha 36 anos, o cabelo negro, estava na pujança da vida, irradiava confiança, impunha o respeito e disciplina a mim, seu jovem e inseguro aluno.

Ontem, encontrei-o com a delicadeza e a simpatia que o peso dos anos conferem. Mais sábio, com dúvidas, incertezas e receios que há 56 anos, de certo, não tinha.

É assim a vida, torna-nos humildes e a arrogância, se a houve, esmoreceu-se com o passar do tempo. Deixou de meter medo aos alunos que se preparavam para ser examinados, medo infundado, de resto, porque o seu interrogatório era leal.

Recordei-lhe uma ou outra coisa do passado e ele sorriu... quantos milhares de alunos não terá ele tido ao longo de toda a sua vida? Eu fiz apenas parte do 1º grupo desses alunos no já longínquo ano lectivo de 1959/60.

Sabe, disse-nos ele, quando vou à minha aldeia, para os lados de Macedo de Cavaleiros, Grijó de Vale Benfeito, os velhos de 70 anos vêm ter comigo, abraçam-me e choram.

“Havia antigamente uma escola e eu pus lá outra, hoje nem uma criança se vê... as pessoas eram então muito pobres mas felizes, agora vivem tristes.”

O Prof. Adriano Moreira é hoje uma pessoa na qual a sensibilidade cresceu com os anos. A CPLP, Comunidade de Países de Língua Oficial Portuguesa, é uma “janela” para Portugal, uma Comunidade de Afectos, nada que se confunda com a Commonwealth que já existia antes das independências e não tem a ver com afectos que tenham ficado depois dos ingleses partirem.

Se algumas dúvidas existissem a este respeito lembro a minha experiência de 15 meses, nos anos de 1963/64, vivendo na fronteira entre Angola e a Rodésia do Sul, hoje Zâmbia, onde os ingleses eram denominados pelos Luenas, de brancos e os portugueses de... portugueses. Era o princípio da comunidade de afectos, uma raiz longínqua da CPLP.

A outra “janela” de Portugal, para Adriano Moreira, é o mar e a plataforma continental, a maior de todas no mundo chamando a atenção para  a importância do trabalho das Universidades de Aveiro, Algarve e Açores para a valorização desse património e estremece quando houve falar no “mar europeu”...

Da sua formação católica fala-nos da importância da família como o grande pilar da sociedade e dos valores e princípios como suporte da vida em sociedade e, puxando a brasa à sua sardinha ou talvez não, do valor e contributo dos velhos.

Eram velhos os homens que lançaram e construíram a Comunidade Europeia: Schuman, Jean Monet, Adenaur, Willy Brant, velhos foram os Papas da sua admiração terminando agora no Papa Francisco.

Estávamos numa reunião promovida pela APRE, todos com mais de 65 anos e o elogio aos velhos pareceu muito a propósito sem deixar de ser verdadeiro.

Sem princípios e valores não há confiança, por isso os terroristas do denominado Estado Islâmico não matam príncipes nem ministros, matam inocentes para minar exactamente a confiança das populações nos respectivos Estados e dessa forma enfraquecê-los.

Toda a nossa história mostra que Portugal não tem existência sozinho aqui no canto da Europa. Éramos um milhão de pessoas no tempo de D. João II quando começou a nossa luta por outros espaços. Homens eram metidos em barcos e lá iam eles sem que alguém soubesse para onde deixando o país entregue às mulheres que asseguravam a criação dos filhos e a transmissão dos valores e dos costumes.

Demos a volta ao mundo e estamos regressados, finalmente, ao espaço que é o nosso: a Europa. Temos que lutar por ela, aperfeiçoá-la nas suas instituições, dar-lhe força, sobreviveremos com ela ou morreremos fora dela, não há mais por onde ir.

Olhando para a história e para a Europa vemos os países colonizados pelo antigo Império Romano: Chipre, Grécia, Itália, Espanha, Portugal que constituem agora uma espécie de caminho inverso que as populações destes países percorrem para trabalharem nos países ricos do norte da Europa, antigamente o território dos bárbaros, os mesmos que destruíram Roma e o Império Romano do Ocidente.

Agora é indispensável que a Europa se defina quanto ao seu destino: ou a Alemanha se incorpora na Europa ou os restantes países do Sul da Europa se tornam numa extensão da Alemanha com gravíssimos riscos. A continuação de uma Europa rica a Norte e pobre a Sul não corresponde ao projecto europeu,

A actual crise e dificuldades resultantes de um Ajustamento das economias por força de um Tratado Orçamental que tem de ser revisto, irá ter efeitos perniciosos na relação de confiança entre os cidadãos e os Estados, em Portugal, Espanha, Itália, Grécia e na própria França, levando ao aparecimento de franjas da população cada vez maiores com tendências independentistas e de isolamento.

O Prof. Adriano Moreira foi uma das personalidades que assinou a lista para a reestruturação da dívida a qual, por questões semânticas aparentemente incompreensíveis, foi lida como não pagamento da dívida o que nunca esteve no pensamento dos signatários.

O principal problema da Comunidade Europeia tem a ver com o papel da Alemanha. Neste momento coloca-se com premência a questão da Grécia mas será ela um problema grego ou europeu? – Da resposta a esta pergunta poderá depender o desfecho da situação.

O Prof. não augura o futuro de uma Grécia fora do Euro e da Europa e desta, por sua vez, sem a Grécia, que mesmo com o equilíbrio que regista entre importações e exportações ficaria só, sem ninguém que a ajudasse logo no dia a seguir à sua saída. Tem a palavra a diplomacia.

Esta, terá sido a minha última aula com o Professor Adriano Moreira, fui um privilegiado nesse aspecto embora, como ele próprio reconheceu, a grande aula, agora que nós, os velhos, vamos estando de partida e em termos de balanço final, a grande aula, aquela que ensinou mesmo, foi a da vida.

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