(Jorge Amado)
Episódio Nº 219
Leva-e-Traz, diziam para designá-lo, mas
a esse levar e trazer e ao hábito de exagerar - no que se parecia a Pedro Ogano
- deve-se ainda acrescentar a mania de
prever o desenvolvimento de cada assunto, anunciando o que iria suceder.
Além de Leva-e-Traz, alcunharam-no
também de Vosmicê-Vai-Ver. Figura familiar na Baixa dos Sapos, metia-se
constantemente em camisa de onze varas em conseqüência de seus constas, seus estão-dizendo-por-aí,
dos boatos e dos zunzuns, mas sobretudo devido às conjeturas e aos agouros.
Andou levando uns pegas, umas corridas
de quengas de maus bofes que se consideraram injuriadas ou caluniadas por
Vara-de-Pescar, se bem, em geral, fosse recebido com agrado e curiosidade ao
despontar no puteiro com ar misterioso e a pergunta habitual: já sabe da
novidade?
Por Já-Sabe? saudavam-no ao vê-lo
surgir, galalau de pernas de compasso e olhos arregalados.
Graças a Durvalino, Fadul andava de
grande: já não tinha de se levantar antes do sol para atender à saída dos
tropeiros passara-lhe a penosa obrigação. Chegava ao balcão depois de aliviar a
barriga, mergulhar no rio e tomar o café com farinha, jabá e rapadura.
Pronto para ouvir, junto com o cordial
“bom dia, patrão”, as notícias, os comentários e as previsões de empregado que
não ia à casinha, ao rio e ao fogão, antes de despejar o saco:
-
Vosmicê já sabe o que tá havendo entre Tição e Bastião da Rosa pro mode Diva?
Todo mundo sabe...
Também Fadul sabia, o próprio Durvalino
chamara sua atenção para o interesse com que os dois citados personagens rondavam
a filha de Ambrósio e de Vanjé, arrastavam-lhe a asa, à vista de todos.
Com a tendência para a jogatina
característica da população de Tocaia Grande - a estável e a transitória – já apostavam
sobre qual dos dois levaria a melhor no torneio de agrados e cortesias pela conqui sta do cabaço da galante sergipana.
Que Diva fosse cabaço não cabia dúvida,
nem o próprio Já-
Sabe?, língua comprida e viperina,
levantara qualquer suspeita a esse respeito: virgem até o momento em que Castor ou Bastião, um
dos dois, lhe fizesse o serviço.
A opinião pública encontrava-se
evidentemente dividida ao meio a propósito do resultado da contenda, mas
Durvalino tinha ponto de vista formado, não admitia discussão, era categórico:
-
Vosmicê não acha que seu Bastião ganha de longe? É muita petulância de seu
Tição pensar que Diva vai preferir um negro feio, um estupor - aqui pra nós que ele não me ouça - a
um branco que até parece raciado de
alemão? Seu Tição vai arrastar lata, vosmicê vai ver.
- Tu acha que Tição é feio porque é
negro mas pra tu ser negro igual a ele falta quase nada. Durvalino era ainda
mais escuro do que a tia, mulata cor de cacau seco: - Cor não faz boniteza nem
feiúra de ninguém, tanto pode ser bonito branco ou preto.
Baixando a voz, considerou como se
falasse consigo mesmo: - - Zezinha se
fosse branca não era tão bonita...
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