Não queria ir embora sem ver meu turco |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 216
Bem mais tarde ela o acompanhou até a
beira do rio, onde Fadul viera encher uma lata de água para
as necessidades da casa, naquele dia ainda maiores: Zezinha, devido ao medo de
doença feia, tinha mania de limpeza.
O
fogo aceso no descampado, os fifós, uma ou outra estrela iluminavam a noite de
breu. Eles iam de mãos dadas: de tão enleada Zezinha era ver uma donzela
passeando com o namorado às escondidas da família.
- Por que tu não manda cavar um poço
para ter água em casa?
- Custa dinheiro.
- Mais custa a trabalheira que tu tem.
Onde já se viu?
Ele encheu a lata, qui s voltar, tinha pressa de estendê-la na cama:
tantas vezes em sonho ali a perseguira, tentando agarrá-la.
Devassa e cruel, ela se oferecia mas não
se entregava, fugia-lhe dos braços, ria-lhe na cara. Chegara o dia da forra, ia
cobrar com juros de agiota.
- Vambora...
- Inda não.
Puxou-o pelo braço, sentaram-se à beira
d’água, junto ao Bidé das Damas, os pés na correnteza, ouvindo o coaxar dos
sapos.
Zézinha encostou a cabeça no ombro largo
do turco, enfiou a mão por dentro da camisa para acariciar-lhe o peito
cabeludo.
- Não queria ir embora sem ver meu
turco.
- E sem me enfiar a faca, não é mesmo? -
Falava em tom de brincadeira, sem sotaque de queixa ou acusação.
- Vim buscar ajuda, não vou mentir. Mas
não foi só por isso que eu vim, Deus é testemunha. Tu é um turco bruto e ignorante,
tu pensa que eu não tenho sentimento.
Fadul a envolveu nos braços e a olhou
dentro dos olhos: as lágrimas já não eram devidas à morte do pai. Eram lágrimas
de saudades e bem-querer, choradas na noite de encontro e despedida.
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