Tu já vai saber |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 238
A coisa que eu mais gosto é de dançar,
revelara Ção na venda de Fadul e assim era. Não esquentava cadeira, passava de par
em par, e ela própria penava e escolhia cavalheiro, convidando-o sem cerimônia:
me tire, vamos, ao ver um de seus preferidos - Fadul, Castor, Bastião da Rosa,
Guido — parado a matar o bicho, dando sopa.
Percorreu o salão abraçada a Pedro Cigano: com
uma das mãos o sanfoneiro manejava a harmônica, com outra rodeava-lhe a
cintura. Seu Pedro Cigano, bonito como o Cão!
Tendo deixado Coroca saracoteando com
Balbino, Castor dirigiu-se para o improvisado balcão onde Leva-e-Traz, vendo-o aproximar-se,
encheu um copo e lhe ofereceu antes mesmo que ele o encomendasse:
- Nunca vi vosmicê tão influído, seu
Tição... - Na voz, admiração e espanto: o ferreiro não dava o braço a torcer,
devia estar se comendo por dentro mas não demonstrava como se o embeleco em
nada lhe importasse.
Se ouviu, Castor Abduim não respondeu
nem comentou. Engoliu o trago e pediu mais. Durvalino serviu, recolheu a paga, apressado:
precipitou-se para onde estava Ção inacreditavelmente livre, à espera de
convite:
- Vou ali, já volto...
Tição o acompanhou com os olhos e o viu
sair pulando com
Ção, desengonçado e animadíssimo.
Bastião da Rosa dançava com Vanjé, o sabidório. Foi quando percebeu uma sombra
e levantou a vista para o vulto de pé em sua frente. Olhando-o de viés, sorriso
marombeiro, deslumbrante no vestido de babados, Diva arrulhou uma queixa:
- Ocê não vai me tirar pra dançar?
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Concluída e entregue a casa de farinha,
raspada e espremida a mandioca, torrada a primeira desmancha, nem assim Bastião
da Rosa deixara de aparecer para filar a bóia na hora do almoço ou para se
reunir com os homens quando, ao morrer do sol, voltavam dos roçados e iam se
banhar no rio.
Azucrinava os ouvidos de Vanjé e de
Ambrósio, grudado a Diva a curiosear sobre gosto e preferência, sobretudo no que
se referia às necessidades de um casal. Enquanto não se reunia aos carpinas no
início dos trabalhos do pontilhão, cuidava da própria casa para torná-la ainda
mais confortável: terminara a caiação, cavara uma cacimba, construíra fogão a
lenha, igual só o de Merência e olhe lá. Vanjé foi convidada a dar opinião.
Numa tarde cinzenta de chuva fina e
pertinaz, voltando com
Diva do Bidê das Damas onde haviam
lavado roupa e tomado banho, Vanjé falou como quem não quer nada:
- A casa de seu Bastião tá pronta. Fui
ver, dá gosto.
- Ouvi dizer.
Andaram em silêncio, o assunto parecia
encerrado. Mas vencendo prevenções e embaraços, Vanjé prosseguiu:
- Seu Bastião é moço direito. Falou com
eu e com Ambrósio.
- A respeito, Mãe?
Demorou a responder como se a resposta
lhe custasse esforço:
- Tu já vai saber.
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