Tu tá morrendo de contente, benza Deus! |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 237
Aprendera a falar europeu e exibir
ademanes no colchão de plumas, nos lençóis de cetim de Madame La Barone , essa sim uma branca
cor de leite, loira cor de mel.
Começou por convidar Zilda para um xote.
Ela viera acompanhada dos oito filhos, os cinco que parira e os três de
criação. O último, afilhado do coronel Boaventura Andrade e de dona Ernestina, corria
solto no galpão, mas as meninas, duas de dez anos - tão parecidas nem que
fossem gémeas, apesar de uma não ser dela - a outra de nove incompletos, não
recusavam cavalheiros.
O
Capitão andava pela Atalaia: a safra começara, ele dirigia os trabalhos da
colheita. Por isso mesmo, Zilda não ficou até o fim. Arrebanhou as meninas e os
mais pequenos - Edu e Peba recusaram-se a acompanhá-la - e se mandou da festa.
Com Zilda abriu a dança mas não
dispensou nenhuma das presentes, moça ou rapariga. Volteou na sala, exímio e
incansável, com Merência e com Ressu, com as três filhas de Zé dos Santos, com
Ção e com Bernarda que não largava a cria nem para polcar, com Dinorá e Lia,
bem casadas, e com as putas todas, sem excetuar qualquer que fosse. Só não
dançou com Diva, par constante de Bastião da Rosa, raramente vista em outros
braços a rodopiar o vestido de babados, na cintura e nos cabelos os laços de fita
cor-de-rosa.
Apenas na contradança da quadrilha,
“anavantu”, “anarriê”, Castor tocou a mão de Diva com a ponta nos dedos, sem a olhar.
A idade não impedia Coroca de ser par
disputado, dama de muitos e antecipados compromissos: guarde a próxima pra mim.
No passo miúdo do coco não havia quem a
desbancasse. Só lá para as tantas Tição conseguiu conduzi-la através do salão
de baile - salão de baile dissera o turco Fadul Abdala ao boiadeiro Misael, indivíduo
de maus bofes, na sempre lembrada festa de Santo Antônio.
Na ocasião o palheiro estava novo em folha
mas, apesar de encontrar-se enxovalhado e envelhecido, caindo aos pedaços - projetavam
construir em seu lugar um barracão para acolher tropeiros e abrigar a feira - Fadul
continuava a designá-lo salão de baile, não fazia por menos.
Por falar em Fadul, também ele não perdia
sol-e-dó, imbatível folião. Já não tinha que se preocupar tanto com a venda de
cachaça, Durvalino se ocupava.
Castor esbanjava animação, rindo e
pilheriando, convidando para tragos, dever de quem era o promotor da festa:
- Vamos folgar, Jacinta, que a morte é
certa.
Coroca acompanhou-o na zombaria mas
recusou-se a acreditar na afetada exuberância do negro:
-
Tu tá morrendo de contente, benza Deus! Por que é que a criatura quando tá
enrabichada fica cega e orelhuda? Não vê e não assunta. - Não disse mais nem
ele pediu explicação.
A festa pegava fogo como queria Tição. A
festa de dona Ester, com a homenageada primando pela ausência. Mas Zinho e Lupiscínio, filho e marido, supriam-lhe
a falta e divertiam-se à la godaça.
Zinho na poeira de Ção, Lupiscínio
comboiando a sardenta Nininha, antiquíssimo xodó, com idade e ranço de
casamento. Zinho disputava as atenções da moleca com Aurélio e Durvalino que,
em tendo ocasião, suspendia o comércio de cachaça.
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