A situação está ficando preta, amigo Fadul |
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 267
Bons brasileiros, diga-se para que a
verdade se complete. Fadul quase esquecera dia e circunstância
do desembarque no porto de Ilhéus, adolescente recomendado ao patrício Emilio
Calim, proprietário do Bazar Alexandria em cujo balcão penara e aprendera.
Mas ainda não se compenetrara: em sua
amada pátria grapiúna, antes dos homens e mulheres vinham os pés de cacau, contavam
mais.
Inesperadamente, seu Cícero Moura, que
devia estar de fazenda em fazenda comprando cacau por conta de Koifman &
Cia, prendeu o burro Envelope no poste do oitão do armazém, achegou-se ao
balcão tomando cuidado para não sujar as mangas do paletó surrado porém
impecável, apesar de todo aquele aluvião de lama.
Fadul chegou a estranhá-lo, pois o
corretor não pediu notícias
do mulherio, não que s
saber de gado novo, O rosto ensombreado, não escondia o desassossego:
- A situação está ficando preta, amigo
Fadul, ninguém quer fechar negócio. Vou esperar por aque
que as chuvas parem.
Fadul admirou-se: esperar em Tocaia Grande ? O
Doutor Permanganato pousava habitualmente em Taquaras onde inclusive viviam
contraparentes seus. O turco não perguntou a razão: no balcão do cacete armado
terminava por saber mais dia menos dia o porquê das coisas sem ser preciso
demonstrar curiosidade ou empenho, sem passar por perguntão.
6
Acompanhada por Tarcisio, Coroca
dirigiu-se para o rancho dos estancianos na outra margem. Ao atravessar o
pontilhão, constatou o crescimento do bojo do rio: cheio e rumoroso descia com
raiva, reclamando. Reparou nos montões de baronesas arrastadas no ímpeto da
correnteza. Uma flor azul, erguida entre duas folhas verdes, mantinha-se
incólume no burburinho das águas, frágil e soberana.
O rio, bom amigo: dava-lhes peixes e
pitus, água para todas as necessidades, nele se banhavam, lavavam roupa, matavam
o tempo em galhofa e prosa e, nas noites claras de lua cheia e nas escuras de
lua nova, casais enrabichados usavam-no para namoro e vadiação, mergulhavam
abraçados nas águas tépidas, gemiam nos remansos, se abrigavam nos desvãos dos
juncos.
Sem quê nem porquê transformara-se em
inimigo, rosnava bravatas, trovejava ameaças. Coroca assim pensou mas nada
disse, para não aumentar a aflição do suplicante.
O rapaz caminhava depressa e tenso, era
natural: Zeferina, sua mulher, queixara-se dos primeiros puxos, dores ainda
leves e intermitentes. Afobado, ele se tocou debaixo do toró para a casinha de
madeira na Baixa dos Sapos.
Não ia esperar que aumentassem as
contracções ou que a padecente começasse a perder as águas, para então sair em
disparada à procura da parteira.
- Chegou a hora da onça beber água, dona
Coroca. Vambora!
Vambora! Quantas vezes Coroca ouvira o
chamado imperativo, atendera à ordem perempt ória,
e saíra, também ela agoniada?
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