segunda-feira, junho 08, 2015

E por que, se mal pergunto, Coronel
TOCAIA GRANDE
(Jorge Amado)

Episódio Nª 263




















Tamanqueiros de profissão, Guaraciaba e Elói ergueram um casebre e começaram a trabalhar, com afinco e aptidão, o couro e a madeira. Guaraciaba por pouco não desova no caminho, tão pejada estava.

Foi a pioneira naquela parição; uma das estancianas, Zeferina, fechou o ciclo, teve menino na noite em que a enchente começou.

Cinco fêmeas e quatro machos nas mãos de Jacinta Coroca, mãos abençoadas no incenso da velha Vanjé, louvor que de boca a boca se generalizava: mandavam-na chamar das fazendas próximas.

Da mulher do coronel Setembrino Arruda salvou a vida - a dela e a da cria - transformando em feliz sucesso um parto difícil, prematuro, de sete meses. Dona Beatriz descansava na casa grande da fazenda, entre Taquaras e Tocaia Grande, à espera da data prevista para ir dar à luz em Ilhéus, assistida pela capacidade do doutor Ismael Alves, obstetra ideal seja pela sabença celebrada, seja pela idade respeitável.

De repente foi aquele corre-corre, um deus-nos-acuda: mandaram a toque de caixa um mensageiro com a montaria e ordens de trazer Coroca; voando, a todo vapor.

Chegou a tempo, segurou as pontas, lutou com a morte, palmo a palmo, não teve medo. Será que não?

3

O coronel Robustiano Andrade deu as alvíssaras à comadre Diva, alvíssaras dignas de quem colhia mais de cinco mil arrobas de cacau e marcava com seu ferro tantos rebanhos, incontáveis cabeças de gado pé-duro: bois, vacas, novilhas, bezerros e dois touros guzerás, comprados a peso de ouro no sertão de Minas Gerais, filhos de campeão importado pelo famoso criador coronel Alfredo Machado.

Alvíssaras em nota de quinhentos, estalando de nova.

- Foi Isabel que mandou pra comadre comprar umas bobagens pro afilhado.

Visita de parabéns, por consequência alegre. Entretanto Tição percebeu nos modos do fazendeiro, de hábito conversador e trocista, uma latente apreensão. Não se aventurou a perguntar a causa mas o próprio Coronel, ao despedir-se na porta da oficina, revelou:

- Estou muito preocupado, Tição. Muito mesmo.

- E por que, se mal pergunto, Coronel?

 - Está chovendo sem parar nas cabeceiras do rio, uma corda- d’água cada vez mais forte, O rio está enchendo por demais, não sei o que vai acontecer. Deus queira não se passe nada.

Pelas dúvidas, tomei providências para retirar o gado para aquele casco mais no interior onde fica o criatório de bezerros, você conhece.

Também ali a chuva lavava o vale, engordava o rio. O fazendeiro e o ferrador de burros demoraram-se um instante examinando o céu coberto de nuvens negras, carregadas, ouvindo o zunido do vento atravessando a mata.

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