terça-feira, julho 14, 2015

Assim Nasceu 

Portugal

(Domingos Amaral)





Episódio Nº 15









Meu pai e meu tio, que tinham apenas um ano de diferença e estavam ambos a chegar aos quarenta, faziam a sua ronda matinal cada um vestido com a sua dalmática, verde a do meu tio, azul a do meu pai.

Pareciam dois pássaros exóticos, avançando em pequeninos passos, enquanto iam relembrando os culpados da desordem cristã.

Afonso I de Aragão; Dona Urraca; Gelmires, o maligno arcebispo de Compostela; Pedro Froilaz de Trava, pai de Bermudo e Fernão, e perceptor do futuro herdeiro, Afonso Raimundes. E também Dona Teresa.

 - Mas talvez o maior culpado seja Afonso VI – cocluiu Ermígio Moniz.

O velho imperador, avô de Afonso Henriques, baralhara tudo com os seus caprichos terminais. Era uma sombra do gigante que conquistara Toledo aos infiéis, o mais grandioso de todos os reis de Leão desde os visigodos.

As suas decisões sucessórias, abruptas e ilógicas, haviam lançado a confusão na Península.

Ao longo da vida Afonso VI casara com muitas mulheres, porém elas só lhe davam filhas. Urraca, Teresa e outras meninas, legítimas ou bastardas, mas nada de meninos.

Teve de ser uma moura convertida, Zaida, a filha do rei de Sevilha, a deitar cá para fora um rapaz.

Porém, Deus não evita as desgraças mais cruéis, principalmente a quem as procura.

Sancho, o único filho do imperador, foi enviado para a guerra à frente das tropas do pai, e morreu, com apenas treze anos, às mãos deste mesmo califa que agora cerca Coimbra.

Diz-se que Afonso VI ainda uivava de dor cinco dias depois de lhe darem a notícia. O filho fora trespassado por uma lança sarracena, em Uclés, e assim partira deste mundo o único que poderia ter unido cristãos e muçulmanos, pois tinha sangue real dos dois lados.

Sem varão a quem deixar a coroa, desfeito de amargura, Afonso VI olhou à volta, para o resto da sua família. Havia uma primeira filha, Urraca, cujo marido o borgonhês Raimundo, já morrera.

Tinha dela um neto que era o primeiro rapaz da linhagem, Afonso Raimundes apenas com quatro anos. Existia um primo afastado, que reinava em Aragão e se chamava igualmente Afonso. E tinha uma segunda filha bastarda, dona Teresa, que também era casada com um burgonhês, o conde Henrique, e que acabara de ser mãe do seu primeiro rapaz, Afonso Henriques.

 - Contra a vontade dos seus conselheiros, o velho rei desafiou o destino e promoveu uma união arriscada – recordou o pai.

Afonso VI obrigou a filha viúva, Urraca, a casar com o primo distante, Afonso I de Aragão, e determinou que o primeiro varão fruto desse casamento seria o futuro imperador da Galiza, de Leão, de Castela, de Aragão e até de navarra; o rei dos Cinco Reinos e aquele a quem prestariam tributo as taifas, os pequenos reinos mouros da Ibéria, como Sevilha, Córdova, Saragoça, Múrcia e Badajoz.

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