Não podiam abandoná-la sozinha. |
TACAIA GRANDE
(Jorge Amado)
Episódio Nº 283
Naquela confusão de medo e de tristeza, os
moleques riam alegremente. A cheia para eles não era uma calamidade, era
estupenda diversão, aventura apaixonante. Felizes, no navio dos piratas,
capitão e marinheiros.
Descarregada dos ombros de Fadul, sia
Leocádia, antes de galgar, em companhia das paridas, os degraus da subida para
a casa do Capitão, perguntou por Das Dores.
Vira-a carregando porcos para o morro, mas
quando Altamirando passara diante da casa de farinha indagando pela filha,
estava desacompanhado.
Não podiam abandoná-la sozinha, sem
recursos, na dependência da volta do marido.
Fadul e Tição entreolharam-se e, sem
trocar palavra, dirigiram-se para a margem oposta, de onde tinham acabado de
chegar.
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Tão ansiosos, o turco e o negro não
escutaram os gritos de
Diva, perdidos na zoeira da enchente. Gritos
altos, contidos soluços: trazia nos braços o corpo da cadela Oferecida que se
afogara ao tentar acompanhá-la.
Diva se atirara na água para atravessar o
rio e ser de auxílio à família no outro lado, não agüentava ficar à espera de
notícias.
Não notou que a cadela a seguira desde a
casa do Capitão. Somente ao chegar à outra margem, e ao estender a vista pelos
arredores, se deu conta, tarde demais.
A correnteza arrastara Oferecida para o
fundo e a arremessara contra as pedras submersas. Diva enxergou o sangue
borbulhando, antes de ver o corpo que boiou mais adiante num derradeiro
estremeção.
Conseguiu alcançá-lo. Diva nadava igual a
um peixe, não era por acaso uma sereia? A pancada abrira a cabeça de Oferecida.
Diva não permitiu que o rio a levasse de
cambulhada com as criações.
No regresso de Tição, cavaram um buraco na
mesma colina onde ficava o cemitério e ali a enterraram, assistidos por um
cortejo de moleques.
Alma Penada ganiu durante horas, postado
junto às pedras com que marcaram o local da cova.
21
Os corpos de Cão e de seu Cícero Moura
foram localizados bem mais abaixo no curso do rio, presos a montões de
baronesas.
Avistara-os, à tarde, o capitão Natário da
Fonseca, que acorria ao chamado de Zilda, varando a estrada.
Na Fazenda da Atalaia, Edu tivera de
varejar as roças à procura de Natário que acompanhava o coronel Boaventura
Andrade numa inspecção aos cacausais: a floração sofria a valer com as chuvas, o
perigo prolongava-se.
Caras fechadas, o Coronel e o Capitão arrenegavam
o mau tempo, remoíam prejuízos.
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