quinta-feira, agosto 27, 2015

Não eram, por acaso, aparentados, a velha e o fazendeiro?
Tocaia Grande
(Jorge Amado)





Episódio Nº 322
















A véspera e o dia dos festejos dos Reis Magos foram lembrados durante a vida inteira pelos privilegiados que viram sia Leocádia, nas noites de cinco e seis de Janeiro, transpor a porta do barracão, calçada de sapatos, alta travessa no cocuruto de cabelos brancos.

Atrás dela desembocava o terno de pastoras com todos os figurantes, para dançar no descampado onde o povo aguardava, reunido, e nas casas particulares, a começar pela residência do capitão Natário da Fonseca onde Zilda cozinhara paneladas de quitutes.

Antes, porém, desses incomparáveis sucessos de Janeiro, houve a preparação, vinte noites de trabalheira e patuscada durante as quais foram traçados os planos e postos de pé todos os detalhes necessários à saída do reisado.

A discussão foi pública – em termos, pois as moças guardavam relativo segredo acerca de pormenores dos trajes de pastora.

Quanto às decisões, pode-se dizer terem sido tomadas por aclamação: sia Leocádia unânime decidia, os demais batiam palmas.

De dois em dois dias crescia a animação com o ensaio da música e dos passos de dança, das jornadas e dos recitativos, decorados na ponta da língua.

 Conforme dissera sia Leocádia ao benemérito seu Carlinhos Silva - obtivera a oferta do bombo -  a festa começava com o primeiro ensaio e se prolongava por quase um mês.

Os presentes à escolha dos figurantes usaram e abusaram do direito de aplaudir as indicações feitas por sia Leocádia: patrona do terno, não admitia controvérsia, ossuda mão-de-ferro.

O capitão Natário da Fonseca comentou com o Turco Fadul a parecença com a designação dos candidatos às eleições para Intendente e edis em Itabuna: a assembléia dos políticos aclamando os nomes propostos pelo coronel Boaventura Andrade.

Não eram por acaso  aparentados, a velha e o fazendeiro?

Reunidos no barracão os interessados e os curiosos, na prática a população inteira, sia Leocádia distribuiu a figuração. A Senhorita Dona Deusa seria a neta Aracati: devido à febre, seus quinze anos tinham passado em brancas nuvens. Vestido de palhaço, ainda uma vez Vavá triunfaria no papel de Mateus, arrastado e preso pela soldadesca.

Amâncio morreria de desgosto se coubesse a outro representar a temida Besta-Fera, também conhecida por Jaraguá e Temeroso.

Aurélio carregaria o couro do Boi para que houvesse gente de Vanjé na figuração do reisado. Zinho, Edu, Durvalino, Balbino, Zelito e Jair perfaziam o contingente de soldados que prenderiam Mateus, acusado de matar o Boi.

Quanto ao Caboclo Gostosinho, principal elemento masculino, que contracena e dialoga com a Senhorita Dona Deusa, pela manhã sai Leocádia fora à oficina do ferreiro para convidar Castor Abduim a figurá-lo.

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