Há uns anos atrás, já
bons, um amigo meu, engenheiro numa fábrica de fazer azeite, hoje uma grande
marca de azeites comercializada em Portugal, e a que eu, em rapaz, chamava
simplesmente de lagar de azeite, porque o meu avô tinha um que fazia as minhas
delícias durante as férias de Natal.
Lá passava os dias,
entretido, entre seiras, capachos e o bagaço da azeitona. Mas, o que eu
mais gostava, era quando me sentava para almoçar com os trabalhadores, a sopa
de couves com feijão que a minha avó tinha posto a cozer ao lume da lareira
logo de madrugada e que, à hora da comida, era despejada sobre um grande prato
de lata, base de uma medida de 10 litros , de onde todos comíamos, depois do
mestre a regar com azeite acabado de fazer, a saber ainda à oliveira, e ele próprio começar a comer, por
uma questão de respeito. Coisas de outros tempos…
Mas, dizia-me esse
amigo engenheiro, que em casa dele não tinha televisão e que as filhas, se qui sessem, fossem vê-la a casa das amigas. Tinha
sido uma opção dele.
Passados todos estes
anos não sei se o meu amigo engenheiro, de então, já tem televisão ou continua
fiel à opção feita.
Eu tenho televisão,
daquelas 3D, com uma imagem tão nítida e perfeita que até parece bruxedo, mas a
utilização que hoje lhe dou é diferente.
Para não me alongar
muito, direi que migrei. Não consegui acompanhar os gostos dos meus concidadãos
que alimentam os canais generalistas e fui-me embora, ver algum desporto, dois
ou três desafios de futebol ao fim de semana, os grandes torneios de ténis e de
atletismo e os canais temáticos, perfeitamente inofensivos, da Odisseia,
National Geografic e História.
Fujo,
principalmente, dos telejornais cujas notícias já li, logo de manhã, no meu
Diário de Notícias, enquanto no Café tomo o pequeno almoço.
As imagens da
televisão que acompanham as notícias são escolhidas para nos ferirem a
sensibilidade, chocarem-nos, como se fôssemos todos masoqui stas e gostássemos de sofrer.
Quem se fixe muito nelas, corre o risco de ter
pesadelos e ver a sua casa a arder quando, na época dos fogos, que entre nós
entra pelo Setembro dentro, recebe, na sua televisão da sala, "overdoses" de mato
e árvores a arderem, com os bombeiros em segundo plano e um senhor em destaque, com
um microfone nas mãos, que nos repete por várias vezes e quase sempre de forma
atrapalhada, a descrição do que, nós próprios, estamos a ver.
Pior, agora, é o de podermos acordar com pesadelos de rostos de pessoas, homens, mulheres e crianças, elas de
cabeça coberta com um lenço, e todos de feições inexpressivas que espreitam do qui ntal da nossa casa para o quarto onde dormimos e
nos dizem, na indefinição do seu olhar: “estamos aqui
e queremos entrar”.
Eu tive um
pressentimento mau a quando das “primaveras árabes” vividas em 2010 por quase
todos os países do Norte de África de onde agora fogem, em reportagens de então
cheias de opt imismo, como era
documentado.
- Como iriam eles
concretizar os sonhos que estavam a festejar? – Foi este o pressentimento que tive, mau,
perigoso, mas não nada disto. Era impossível.
O que está a
acontecer é muito pior que tudo aqui lo
que de mau se pudesse pensar. Só um catastrofista o poderia imaginar e, mesmo
esse, tenho muitas dúvidas que tivesse imaginação suficiente.
Será deste mundo
imagens de homens a cortar pescoços de outros homens ajoelhados a seus pés e a
televisão fazer a transmissão dessas cenas para as nossas casas?
Não há palavras, não
há pensamentos, apenas a vontade de não acreditar, aqui lo
não podia ser verdade, não podia ter acontecido.
Mas, se aconteceu,
por que não partiram no outro dia os exécitos dos países ocidentais: ingleses,
franceses, americanos, em perseguição daqueles criminosos?
- Porque continuam
eles a matar e a destruir sem que ninguém os afronte directamente?
- Julgavam que o Mar
Mediterrâneo seria obstáculo suficiente para impedir que as pessoas fugissem
daqueles loucos perigosos?
Não! É tudo
demasiado mau. Para salvaguarda da estabilidade do nosso espírito, para
podermos dormir sem pesadelos, temos mesmo que migrar dos canais generalistas e
de notícias da televisão.
Fiquemo-nos pela
leitura do jornal enquanto tomamos o pequeno almoço porque este é o mundo que
existe e nós estamos nele. Só por isso.
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