(Domingos Amaral)
Episódio Nº 47
Aperaltado numa luxuosa
dalmática escarlate com um belo punhal à ilharga, no topo de cujo cabo se
destacava uma pérola, Paio Soares parecia, não seu pai, mas seu amo e senhor.
Rico homem da Maia e antigo
Alferes do conde D. Henrique, Paio Soares afastara-se de Dona Teresa há uns
anos, receando as ameaças da rainha Urraca, mas agora que esta morrera havia
quem dissesse que Dona Teresa o tentava aliciar de novo e por isso o convidara
para passar a Páscoa em Viseu.
Embora alguns ainda
recordassem a recusa de ir a Lanhoso ajudar a mãe do príncipe, seis anos antes,
não havia nenhuma humilhação irrazoável, nem ofensa pessoal entre ele e Fernão
Peres.
Todos estimavam aquele nobre
portucalense, respeitavam com respeito as suas façanhas de combatente contra os
mouros e sabiam também que dispunha dos maiores territórios do Condado.
Além disso, estava viúvo,
pois morrera-lhe a esposa há dois anos, e do seu casamento religioso haviam
nascido duas raparigas, ambas mortas em criança.
Aos quarenta anos, aquele
era um homem poderoso, mas solitário, e era esse vazio que Dona Teresa visava
preencher, procurando para ele uma esposa capaz de dar-lhe um varão legítimo.
A nova política matrimonial
de Dona Teresa e do Trava era límpida e interesseira: casar os nobres do Sul da
Galiza com as meninas nobres de Entre Douro e Minho, e os nobres de Entre Douro
e Minho com as meninas nobres do Sul da Galiza.
Uniam-se assim as duas
regiões que o Rio Minho separava e Dona Teresa e o seu Trava tornavam-se ainda
mais poderosos e candidatos a preencher o vazio criado pelo recente falecimento
da rainha dona Urraca de Castela, Leão e Galiza, que entregara a alma ao
criador no mês anterior.
A infame rainha, meia irmã
de Dona Teresa, deixara feridas espalhadas pelos reinos da Hispânia, daquelas
difíceis de sarar.
Embora o seu óbvio sucessor
fosse o filho Afonso Raimundes (que em breve seria coroado como Afonso VII)
havia dúvidas quanto ao destino final da Galiza e do Condado Portucalense.
Seria possível unirem-se,
num novo reino, como os irmãos Moniz de Ribadouro jurava ser o sonho do
falecido conde Henrique?
Ou submeter-se-iam em
separado ao novo rei?
Fosse qual fosse o futuro,
os casamentos arranjados por dona Teresa fariam parte dele, e, no meu caso, não
me possa queixar disso, embora haja quem possa.
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