quinta-feira, outubro 08, 2015

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)




Episódio Nº 78
















Gostava da disponibilidade permanente da minha prima, mas confessou-me que gostava de Chamoa.

A bela galega era feminina e irresistível, embora ele pressentisse nela uma inquietude perigosa, causada pelas lisonjas masculinas.

Chamoa adorava ser cortejada, isso via-se a léguas, e o meu amigo, tal como minha esposa Maria, temia o ligeiro descontrolo das suas tentações.

Gulosos machos, como Paio Soares ou o primo Mem Tougues, de bom grado lhe ferrariam o dente.

Julgo que foi em Viseu que o meu melhor amigo descobriu o que era ter ciúmes. Sentia-se encantado, mas também sujeito à rivalidade, à disputa.

Não desejava ser dominado, ficar à mercê dela, e rastejar a seus pés seria uma fraqueza imperdoável para um príncipe.

Talvez por isso, naquela manhã o meu melhor amigo, estava sempre a dar uma espécie de estremeções espartanos. Ele dizia que era para espevitar...

Ao ver o príncipe sacudir-se mais uma vez, Gonçalo cuspiu para o chão. Continuava enjoado, ainda lhe corria o vinho nas veias e as tripas tinham-se revoltado, expulsando o toucinho que comera na véspera na estalagem.

Porcaria que nos serviram – resmungou.

O príncipe perorou:

 - Não culpeis o vinho, bebestes de mais.

Gonçalo, irritado, protestou:

 - Que sabeis vós, haveis estado lá?

Afonso Henriques sorriu. Era sempre assim, o filho do Sousão.

Afogava-se no vinho, como o Braganção, que nunca mais chegava.

 - Nem sabem o que perderam... – murmurou Gonçalo.

Depois de filhar a sua soldadeira, já o Braganção partira, Gonçalo contou que encontrara Elvira, muito melosa também a querer folgar.

 - Fomos para o celeiro e estava enamorada de mim!

Afonso Henriques, que o conhecia bem, desmontou a gabarolice.

Sois um reles mentiroso, ela não é dessas!

Entretanto, uma mulher saíra das cozinhas, com um tabuleiro carregado de pão, e ofereceu-nos de comer, interrompendo aquela celeuma toda.

Estávamos já a abocanhar os pães quando ouvimos uma voz cavada e funda nas nossas costas:

 - Padeira: não ofereceis pão a quem veio da Terra Santa?

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