Num impulso rápido, apossou-se do revólver |
Tocaia
Grande
(Jorge Amado)
Episódio Nº 378
20
Quando o Turco Fadul se viu sozinho, Edu e
Durvalino derrubados no chão, um morto, outro morrendo, sem bala no revólver nem
munição no cinto, atirou-se em cima do cabra mais próximo que outro não era
senão Benaia Cova Rasa.
Com as duas mãos, aquelas mãos disformes
com que desapartava barulhos e convencia os mais renitentes, duas tenazes,
apertou o pescoço do bandido mas não chegou a estrangulá-lo: recebeu dois tiros
dos pistoleiros, um no ombro, outro no pescoço; afrouxou os dedos e arriou.
Não o mataram logo: atendendo às ordens de
Benaia que, esbaforido e ofegante, respirava com dificuldade, amarraram o gigante
e o depositaram no curral onde estavam entrincheirados.
Benaia pretendia ocupar-se dele quando a
luta arrefecesse.
Por alguns minutos Fadul deixou-se ficar
imóvel, juntando forças. Sangrava no pescoço e no ombro mas conseguiu encher o peito
de ar e, inflando o tórax, rompeu as cordas de prender bois com que o haviam
atado.
Num impulso rápido, apossou-se do revólver
de um dos cabras e começou a atirar. Mandou dois para o inferno e mais não fez
porque Benaia descarregou-lhe no corpo seis balaços.
Não podendo acabá-lo a faca, devagarinho,
como planejara, Cova Rasa esbravejou, ludibriado e enfurecido.
Assim morreu Fadul Abdala, o Grão-Turco, o
Turco Fadul, seu Fadu dos alugados e tropeiros, mascate de extensa tradição, bodegueiro,
cidadão insigne do arraial, celebrado pelo tamanho da estrovenga, respeitado pela
força bruta, bem-visto pela afabilidade no trato, querido pela natureza franca
e solidária: não fora ele quem decretara, em priscas eras, que, em Tocaia Grande , eram todos
por um e um por todos.
Nas calendas, fizera um pacto com o bom Deus
dos maronitas que ali o trouxera pela mão. Cumpriu sua parte até o fim, apesar de
todos os pesares, e na hora de morrer, cobrou do Senhor o desamparo.
Numa névoa viu passar diante dos olhos
turvos a figura de Zezinha do Butiá, acenando um lenço de ramagens da porta do
vagão. Abria a boca mas em lugar de balbuciar uma palavra terna, gritava o
grito de Siroca quando ele a descabaçara.
Tendo tantas criaturas lindas em quem
pensar, foi na moleca que pensou quando rendeu o corpo a Deus, ao bom Deus dos
maronitas.
Bom Deus? Ache quem qui ser,
indignou-se antes de vomitar a alma: - Um embusteiro sem palavra, um patife, um
bom filho da mãe, que faltou ao trato feito, iá-rára-dínak!
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