quarta-feira, fevereiro 10, 2016

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)

Episódio Nº 186




















Fiquei desarmado com a sua doçura, e todos percebemos que não era concebível qualquer tramóia suja por parte daquela mulher, cujo coração era bom.

Então Paio Mendes perguntou-lhe:

 - O que ireis propor ao rei?

Teresa lembrou que, indo Afonso VII a Compostela agradecer ao apóstolo as suas vitórias no Leste, Afonso Henriques poderia acompanhá-lo em peregrinação, num gesto bonito e simbólico, honrando também os feitos do seu primo, o que, certamente muito lhe agradaria.

Amansado o rei, a vassalagem podia ser adiada, marcando-se novo encontro para Toledo, aquando do segundo aniversário da coroação.

Para Afonso Henriques, aquela seria uma forma elegante de sair do cerco sem humilhação de uma derrota, mas com o dever de uma promessa.

Quando ela terminou, todos ficaram pensativos, enquanto Gonçalo tamborilava os dedos e murmurava:

 - Ela conhece-o muito melhor do que nós.

Teresa de Celanova perante o malicioso comentário, replicou:

- É bem verdade, Gonçalo. Conheço o Raimundes há muito e sei que, ao contrário do seu avô e de sua mãe, não é cruel com a família.

Afonso Henriques é seu primo, sempre gostou dele e estou certa de que prefere rezar a seu lado do que guerreá-lo.

De testa franzida, meu tio Ermígio Moniz perguntou à cunhada:

 - E se o rei recusar?

A bela mulher sorriu, confiante, e declarou:

 - Se for eu a falar com ele estou certa de que não recusará.

Ouviu-se, mais uma vez, a voz sibilina do Gonçalo:

 - Também tenho a certeza disso...

Mais uma vez, Paio Mendes fuzilou-o com o olhar, mas depois virou-se para o príncipe e argumentou:

 - De momento, o fundamental é salvar Guimarães!

 Sem alternativas, Afonso Henriques, deu o seu aval à ideia e nessa mesma tarde uma comitiva dirigiu-se à tenda do rei de Leão, Castela e Galiza, tendo regressado já a noite caíra.

Na mesma sala onde havíamos estado horas antes, o meu pai declarou sorridente que o cerco seria levantado nas condições propostas.

Uma sensação geral de alívio instalou-se, e houve logo quem visse outros méritos na situação.

O Trava vai ficar furioso! – exclamou Gonçalo.

Todos nos rimos, mas Afonso Henriques, ainda agastado com a emboscado de que fora vítima, proclamou que em Compostela, avisaria seu primo de que iria guerrear o Trava e sua mãe!

 - Não aceito mais traições! Além disso, o povo está contra eles. Há fome em Coimbra e em Viseu, enquanto aqui se vive melhor.

O Governo do Condado está nas mãos erradas!

Depois agradeceu a Teresa de Celanova a iniciativa, tendo ela contraposto que teria muito gosto em acompanhá-lo à catedral do apóstolo de Santiago, o que levou Gonçalo a murmurar:

- É evidente...

Desta vez meu pai enervou-se. Ao contrário de minha esposa, Maria Gomes, Maria Gomes, que já engravidara, Teresa ainda não o conseguira, e meu pai temia que o antigo afecto dela pelo rei se reacendesse.

- Tendes de regressar a Lamego, meus filhos precisam de quem lhes dê atenção! – exclamou.

Admirada, Teresa protestou:

 - Mas fui eu que convenci o rei! E já não vou a Compostela há anos , quero rezar junto do apóstolo, por vós e por vossos filhos!

No seu canto, Gonçalo, murmurou de novo:


- É evidente...

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