quinta-feira, fevereiro 18, 2016

Do lixo financeiro ao lixo político

14/02/2016 - 00:30
















Ainda respiramos em Portugal um clima político que fará inveja a outros países, apesar do populismo do Bloco e do anacronismo do PCP.



1.    A subida das taxas de juro da dívida portuguesa a 10 anos tem, como toda a gente sabe, múltiplas explicações, umas mais importantes do que outras. Não se deve apenas à forma como decorreu a negociação do Orçamento para 2016 em Bruxelas, nem sequer à composição do apoio parlamentar ao Governo de António Costa.

2. Deve-se à extrema volatilidade dos mercados financeiros, que procuram lugares seguros para investir (mesmo que a juros negativos) e que tem na sua origem, para além das nuvens carregadas que impendem sobre a economia global, alguns sinais preocupantes sobre a situação do sistema bancário europeu.

3.   Esta é a realidade, a verdadeira, não a “da esquerda” que, para os fanáticos da austeridade, só serve para disfarçar a culpa de um governo que ousou pôr em causa a ortodoxia decretada por Berlim para chegarmos à salvação plena e sem pecado. Muita gente disse isto bastante melhor do que eu.

Desculpem, portanto, a insistência, mas o meu medo é que, do “lixo financeiro” a que as agências nos condenaram, passemos rapidamente ao “lixo político”, esse sim com um alto risco de rebentar de vez com a Europa.
Cito a Economist: “Para os que temem que a repetição da crise 2007-2008 esteja iminente, a semana passada trouxe novos presságios. As acções de grandes bancos mergulharam (…). Os custos de garantir as dívidas dos bancos contra o default subiram fortemente, especialmente na Europa”.
 A parte de que gosto mais é esta: “O patrão do Deutsch Bank sentiu-se obrigado a declarar que a instituição que lidera é ‘sólida que nem uma rocha’; o ministro alemão das Finanças declarou que não estava preocupado (desta forma aumentando a preocupação).”
A Economist também fala das novas regras de resolução europeias, que responsabilizam os bancos pela limpeza dos seus balanços à custa dos seus investidores e não do erário público, deixando de contaminar a dívida soberana.
 A banca europeia até pode estar mais sólida do que o pânico dos mercados indicia, mas isso pouco interessa. Ao contrário dos EUA (onde há mil maneiras de financiar a economia, para além dos bancos), na Europa o financiamento depende quase totalmente da banca, acentuando a sensação de risco.
O que se debate hoje na imprensa da especialidade é se vamos assistir a um Lehman Brothers europeu, ou se esse é um risco descartável, porque as circunstâncias do sistema financeiro parecem bastante mais sólidas.
 A outra razão que explica o nervosismo dos mercados tem a ver com as perspectivas de desaceleração do crescimento global, por causa da China e de outras grandes economias emergentes, mas também pelas dúvidas quanto à solidez da economia americana.
A Presidente da FED subiu as taxas de juro (é bom lembrar que passaram de zero para zero vírgula qualquer coisinha), mas pode ter de adiar outras subidas, mesmo que o seu objectivo central seja o desemprego, que caiu para uma taxa inferior a 5%.
2. Quando Mário Centeno entrou no Eurogrupo era este o quadro geral. Com os juros da dívida soberana a dez anos a ultrapassarem os 4%, ficou sem qualquer margem de manobra, a não ser comprometer-se a apresentar medidas adicionais até à nova revisão de Abril.
 Há aqui uma lição para o Governo: é preciso ter cautela porque um choque externo desta natureza atinge as economias mais débeis com uma força inesperada.
 Isso quer dizer, em termos de política interna, que António Costa vai ter de explicar aos seus parceiros à esquerda que há uma linha vermelha que não ultrapassará, por mais que eles gritem e ameacem: a presença de Portugal no euro, mesmo que isso possa custar mais do que o previsto.
Isso implica, por exemplo, que contribuam para a estabilidade governativa em vez de andarem a sabotá-la. Não se trata de obediência a Bruxelas.
Como já se viu noutras capitais, nem os esquerdistas (tipo Syriza), nem a extrema-direita (tipo Marine) se atrevem a dar um passo cujas consequências suspeitam que não sejam maravilhosas.
Marine Le Pen lembrou-se agora de que a saída do euro (e da Europa) poderia ser um problema para as suas ambições políticas e lá foi anunciando que alinharia por uma negociação idêntica à que David Cameron leva a cabo.

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