quarta-feira, março 23, 2016

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)




Episódio Nº 220





















A rapariga mostrou um ar preocupado:

- E vossa mãe? As meninas precisam dela!

O príncipe garantiu que Dona Teresa se iria juntar às filhas mais tarde e, olhando para trás, pediu aos seus companheiros se mantivessem fora da tenda, pois queria conversar a sós com a mãe.

A única que não cumpriu aquele pedido foi a minha prima Raimunda, que furtivamente se escapuliu, contornando a tenda e rastejando entrou pelas traseiras, escondendo-se atrás de um baú.

Contou-me que Dona Teres estava sentada num banco, de olhos vermelhos, percebia-se que tinha chorado. Ao ver o filho entrar levantou-se.

 - O Fernão, que lhe haveis feito?

Afonso Henriques olhou a mãe demoradamente. A última vez que a vira fora em Viseu, mais de dois anos antes. Parecia-lhe envelhecida, com rugas pronunciadas, e também mais abatida, mas isso era compreensível, pois tivera uma filha há pouco tempo, além de ter perdido uma batalha fundamental.

Está preso nas masmorras de Guimarães.

Dona Teresa enfureceu-se:

 - Preso? Não o podereis prender! Sou a rainha deste condado, ordeno-vos que o liberteis!

Afonso Henriques abanou a cabeça.

Já não podeis falar assim.

Declarou que a mãe já não era regente do Condado Portucalense. Perdera a batalha e a partir dali seria ele a mandar. Irada, Dona Teresa explodiu:

- Como vos atreveis? Afonso VII nunca o permitirá.

Afonso Henriques olhou em volta e murmurou.

- Não o vejo aqui. E sabeis bem que não vai meter-se entre nós.

Dona Teresa, cada vez mais enfurecida, gritou:

- Maldito! O Fernão é que tinha razão! Sois um traidor!

Lançou as suas acusações, alegou que o filho se armara cavaleiro em Zamora, provocando Afonso VII e colocando-a a ela num terrível embaraço, e que se recusara a prestar vassalagem ao rei, obrigando-o a cercar Guimarães, para grande desonra do Condado!

Afonso Henriques apenas murmurou:

 - Traidor, eu?

Depois, em voz solene e firme interrogou a mãe:

 - Afastais os portucalenses do governo do Condado, nomeais os Trava para governadores, ignorais os pedidos do arcebispo de Braga, e eu é que sou traidor?

Dona Teresa recuou um pouco e Afonso Henriques continuou:

 - Desejais um filho varão com o Trava, para me retirares os meus direitos sucessórios, planeais matar-me, e eu é que sou traidor?

A mãe estava atordoada com a força dos argumentos do filho.

Vindes até Guimarães atacar-me no meu castelo, na cidade onde eu nasci e o meu pai vivia, e eu é que sou traidor?

Dando mais um passo em frente, o príncipe insistiu:

 - Em Viseu peço-vos para casar com Chamoa, para unir a nossa família aos Travas, e vós quebrais a promessa que me haveis feito, casando-a com Paio Soares e eu é que sou traidor?

Respirando fundo, tentando controlar a sua ira, Afonso Henriques exclamou por fim:

 - A traidora sois vós! Vós que vos amancebaste com os Trava, primeiro com o Bermudo, depois com o Fernão! E ainda por cima haveis obrigado a vossa filha mais velha a casar com o vosso antigo amante!

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