(Domingos do Amaral)
Episódio Nº 207
Também desiludida, Zulmira
abanou a cabeça e acrescentou:
- Por duas vezes, senti-me feliz, mas a morte
roubou-me os meus dois maridos. O amor dura pouco tempo.
Talvez o amor não tivesse
força para mudar os destinos do mundo, declarou Elvira. Tudo o que havia
desejado não se havia concretizado.
O turbilhão político que as
envolvia sobrepusera-se às paixões humanas entre homens e mulheres.
- Convenci-me que se vos
casasse bem às duas, Toronho estaria salvo. Nem isso consegui – reconheceu.
Naquela bela e solarenga
tarde, uma sombra caía sobre todos. A guerra entre Afonso Henriques e a sua mãe
aproximava-se. Gomes Nunes prometera ao príncipe ajudá-lo, mas agora que se
adivinhava a batalha de Guimarães o nobre de Tui hesitava.
No entanto, Chamoa evitava
sempre pensar em confrontos bélicos, e com nostalgia relembrou os seus sonhos
de infância.
Quando era nova só pensava
em casar com um príncipe! Ao ouvi-la, Fátima indignou-se.
- E ainda pensais! Haveis prometido deixar
Paio Soares! Eu ouvi-vos, quando Afonso Henriques por cá passou, vindo de
Compostela. E também vi como o haveis beijado no alpendre, ajoelhada.
Elvira franziu a testa mas a
filha encolheu os ombros e rematou:
- Segui o vosso conselho,
minha mãe.
Recordou as palavras da
progenitora em Viseu e depois acrescentou:
- Em troca, exigi a Afonso Henriques que não
matasse o meu marido! E em Guimarães vou obrigar Paio Soares a poupar o
príncipe!
Surpreendida, Zaida,
perguntou-lhe:
- Acreditais mesmo que não vão lutar um com o
outro?
Chamoa estava crente disso.
Ambos me amam, não me vaso
falhar!
Porém, mais experiente sua
mãe avisou-a:
- Em tempo de guerra, as certezas têm vida
curta.
Chamoa encolheu os ombros, despreocupada.
Para ela as questões militares não contavam, só as paixões que os homens lhe
tinham.
- Depois da batalha ficarei
com o príncipe. Mas só se ele afastar a outra, a magricela, não a quero por
perto!
De súbito, Zulmira, animada
perguntou-lhe:
- Poderemos regressar a Coimbra convosco e com
o príncipe?
Saudosa de Mem, Zulmira
queria uma oportunidade para o rever, mas Chamoa duvidou que Afonso Henriques
preferisse ir para o Sul.
Gosta mais de Guimarães –
declarou.
Insistente, a mãe moura
alegou que, caso ele se tornasse regente, teria de viajar pelo Condado e Chamoa
viajaria com ele.
- Não vos preocupeis –
garantiu então a rapariga – Andareis sempre comigo, fazeis-me muita companhia!
Elvira Peres de Trava
franziu a testa, e iria certamente relembrar que não aprovava certas ousadias,
quando um cavaleiro surgiu ao fundo do campo, aproximando-se delas a galope.
Elvira olhou para Tui com o
coração apertado, mas não se via qualquer sinal de agitação na cidade e esperou
tranqui lamente a chegada do homem,
que lhes pediu que regressassem ao castelo.
Quando entraram na sala,
Gomes Nunes estava sentado com a cabeça entre as mãos.
O Trava enviava uma mensagem
desde Viseu:
- A aproximação a Guimarães
das forças de Dona Teresa seria feita em passo apressado, e exigia que o
cunhado e a irmã se lhe juntassem lá, com as tropas que levariam de Tui.
- E agora, que fazemos? –
bradou Gomes Nunes.
O senhor de Toronho
prometera ao príncipe os seus homens mas agora o seu cunhado ordenava-lhe que
alinhasse com Dona Teresa.
Torturado por aquele agudo
dilema, paralisara de indecisão. Então, Chamoa sugeriu ser ela a partir
primeiro, para se juntar ao marido, enquanto o pai se demorava mais tempo,
evitando tomar partido na querela.
Aliviado, o aflito Gomes
Nunes agarrou-se a ela e exclamou:
- Salvai Toronho, minha querida filha!
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