quarta-feira, março 02, 2016

Incluindo o ipicilone...
Tieta do Agreste
(Jorge Amado)


EPISÓDIO Nº 93














Somente uma semana depois Tieta regressou a Agreste, atendendo exactamente a uma chamada de Zé Esteves, transmitindo apelo urgente de dona Zulmira disposta a rebaixar o preço da casa, a entrar em acordo.

Deixara Ricardo à frente das obras, as paredes subindo, sozinho na Toca da Sogra, pois havia três dias o Comandante voltara com dona Laura para o bangalô na cidade.

Três dias, ou melhor três noites, durante as quais tia e sobrinho trocaram o romântico areal das dunas pelo conforto do colchão de crina da cama de casal do quarto do marujo.


Prosseguindo na educação do sobrinho, a lhe ensinar o bem – o bem e o bom – o colchão chegara na hora exacta, quando atingiam um estágio superior no estudo da matéria em que Tieta era mestra competente, emérita catedrática, honoris causa, como dizia em latim o padre Mariano.

Ensinava-lhe em aulas práticas e intensivas quanto sabia, ou seja, tudo, o alfabeto inteiro, incluindo o ipicilone.

Tieta voltou a Agreste na manhã do dia do primeiro desembarque dos seres de espanto projectados do espaço, mas não os viu e deles só veio a ter noticias no fim da tarde por Ascânio exaltado, no auge do entusiasmo:

- Capitalistas do Sul, estudando a possibilidade de empregar capital aqui, no município, em empresas de turismo, coisa de grande vulto, querem asfaltar a estrada e construir hotéis. 

Que lhe parece dona Antonieta? Que diz a isso Leonora?

Empresa de turismo? Em Agreste, aproveitando água, o clima, a praia de Mangue Seco?

Quem sabe, tudo é possível, por que não?

Fizera bem em comprar terreno na praia, devia aceitar a proposta de dona Zulmira, abandonando a posição intransigente, os preços da terra e dos imóveis podem sofrer súbita valorização, em São Paulo, Tieta, assistiu a coisas de espantar.

Com seu faro único, Felipe adquiriu a preço de banana terrenos e mais terrenos em áreas pelas quais ninguém oferecia nada. Poucos anos depois, ganhava fortunas na revenda.

Tieta pediu a Perpétua papel e caneta, escreveu um bilhete a dona Zulmira fechando o negócio, mandou Peto levar.

Decidiu demorar-se em Agreste o tempo necessário para concluir o trato, lavrar escritura, tomar posse da casa. Mesmo sentindo o apelo ardente do corpo a reclamar a urgência do retorno, sabendo que o moço sofreria o fogo do inferno na noite insone, ainda assim resolveu cuidar antes do negócio. 
Aprendera a não perder a cabeça, a não permitir que xodó, por mais forte e exaltante lhe causasse prejuízo.

Ascânio prosseguia a traçar as vias do radioso futuro do Agreste. A mudança começara com a chegada das duas paulistas à cidade, tudo se fazendo agora mais fácil, devido à decisão da Companhia do Vale de São Francisco de incluir Agreste entre os municípios com a energia de Paulo Afonso, a Luz de Tieta.



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