(Domingos Amaral)
Episódio Nº 229
- Foi uma batalha!
Abanando a cabeça, Chamoa
indignou-se:
- Paio Soares teve-vos na ponta da sua espada
e poupo-vos. E vós feriste-o! Por vossa causa morreu o pai dos meus filhos!
Fora em consequência dos
ferimentos que o antigo mordomo-mor de Dona Teresa morrera, embora ele tivesse
passado quase um ano moribundo. Talvez tivesse sido mal tratado ou mal curado.
O príncipe defendeu-se
assim, mas Chamoa nada mais disse. Então colocou-lhe uma questão diferente:
- Paio Soares falou-vos de uma relíqui a que pertenceu a meu pai?
Agora que vencera a guerra
contra sua mãe, o príncipe dava pela primeira vez importância àquele assunto,
que no passado quase ignorara.
- Vosso marido queria falar comigo durante a
batalha, mas...
Afonso Henriques calou-se,
sentindo a trágica ironia daquela situação. Não ouvira o mordomo quando era
possível, ferira-o gravemente , e agora que ele morrera queria saber o que lhe qui sera dizer.
Desolada, Chamoa limitou-se
a abanar a cabeça:
- Meu marido nunca mais falou. Atingido na
boca e na garganta, Paio soares ficara desfigurado e impossibilitado de falar.
O príncipe culpou-se:
emudecera o único homem que lhe poderia revelar o segredo do conde Henrique!
Pesarosa, Chamoa
acrescentou:
- O que sei é que meu marido tinha grande
admiração por vosso pai.
O príncipe questionou-a.
- Então, porque me hostilizou? Porque não se
passou para o nosso lado, conforme lhe pedi em Lamego?
Chamoa alegou que várias
vezes tentara convencer o marido, mas este sempre recusara mudar de partido. Aceitara
ser mordomo-mor porque a amava e queria casar com ela e dela ter filhos, não
porque admirasse dona Teresa.
Orgulhosa, a rapariga
declarou:
- Foi por minha causa que morreu, para não me
perder para vós. E por isso lhe prometi não casar convosco e entrar no
mosteiro, e vós não o podeis impedir. Aqui
é Deus que manda e essa é a sua vontade!
O príncipe irritou-se e
exclamou.
- Não faleis em nome de Deus, de quem não
conheceis as vontades! Se entrais nesse mosteiro, é porque o desejais!
Aquele grito não era o de um
homem desesperado, que temesse perder a sua amada, mas sim o de um príncipe
ameaçador, e por isso Chamoa desiludiu-se.
Se ele a amasse, pensou,
ajoelhava-se e implorava por ela. Mas dava-lhe ordens como se ela fosse já
esposa dele.
Incomodada, afastou-se de Afonso
Henriques em silêncio.
Beijou novamente os três filhos e os pais, o tio e o primo,
abraçou as três mouras.
Zaida tinha as lágrimas nos
olhos, quando Chamoa se dirigiu para a porta do mosteiro, onde duas monjas a
aguardavam.
Ao Vê-la dar aquele passo,
Afonso Henriques ainda lhe gritou em desespero:
- Chamoa, não entreis nessa porta!
A rapariga não olhou sequer
para trás, e quando desapareceu no interior do mosteiro Afonso Henriques
desatou a atirar pedras à parede, colérico.
Só passado algum tempo, se
aproximou da pequena comitiva. Olhando para Fernão Peres, rosnou:
- Regressai à Galiza ou ainda vos mato!
O amante de sua mãe apenas
respondeu:
- Vim despedir-me da minha
sobrinha, nada mais.
Irritado, Afonso Henriques deu
meia volta e subiu para o cavalo, enquanto nas suas costas Fátima comentava:
- Continua sem saber lutar contra mulheres.
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