segunda-feira, abril 04, 2016

Assim Nasceu Portugal
(Domingos Amaral)


Episódio Nº 231

















A balbúrdia só terminara com a nomeação de um novo wali que apreciava Abu Zakaria e logo o apoiou nos seus desejos.

Semanas antes, quando deixou Santarém, Mem soubera que Abu Zakaria se dirigira à taifa de Badajoz, e que estaria já a juntar mercenários, preparando-se para novo assalto a Coimbra, com o propósito de recuperar as mouras.

-Diz-se que o emir de Badajoz também apoia Abu Zakaria, mesmo contrariando as ordens do califa de Marraquexe – contou Mem.

Ao ouvi-lo, Fátima rejubilara:

 - Ele vem buscar-me outra vez, ele ama-me! Serei sua esposa e regressaremos a Córdova para lá reinar!

Mem ficara surpreso com esta afirmação, Córdova integrava a taifa de Sevilha, que também estava sob o jugo do califa Ali Yusuf.

Abu Zakaria talvez conseguisse atacar Coimbra e resgatar as três mouras, embora o almocreve duvidasse que isso fosse assim tão fácil, agora que Afonso Henriques chegara à cidade.

Mas mesmo que o cordovés fosse bem-sucedido, como se tornaria Fátima rainha de Córdova?

A sua pergunta ficara sem resposta, pois a moura ignorara-o, enquanto Zaida lhe sorrira com um olhar carregado de intenções prazenteiras, e Zulmira o abraçara dizendo:

 - Deixa-a falar... Tive tantas saudades vossas, querido Mem.

Porque não vindes até aos nossos aposentos amanhã depois das festas?

Assim ficara combinado, entre sorrisos e ternuras, que fizeram Gonçalo de Sousa levantar o sobrolho, desconfiado.

Quando todos se encaminharam para a alcáçova, este interrogou Mem.

- Sois da família? Tantos abraços só se dá a primos.

O almocreve sentiu ciúme. Gonçalo andava de volta de Zaida, que lhe retribuía os sorrisos constantemente, embora não fosse possível ter certezas sobre o seu significado, pois ela era sempre assim com quem simpatizava, homens ou mulheres.

Foi nesse momento que nos cruzamos com eles. Eu, Afonso Henriques e Peres Cativo, e também Jean e Ramiro, encontrámos as mouras, Mem e Gonçalo.

O príncipe dirigiu-se às mulheres muçulmanas e ao almocreve e ordenou:

 - Amanhã tereis de estar presentes na Sé para as celebrações!

Lembro-me de que, desde que as recolhera à porta do Mosteiro de Vairão, meu amigo Afonso Henriques desenvolvera uma nova curiosidade sobre aquelas três mulheres e as espantosas narrativas das suas existências.

Porque queria um assassino a soldo do califa e porque queria um cordovés libertá-las dos cristãos?

Tais perguntas continuavam sem resposta, mas o meu amigo sabia que elas representavam um perigo permanente.

Esperemos que os vossos amigos sarracenos não nos estraguem a cerimónia – comentou o príncipe.

Irritada logo a impetuosa Fátima exclamou:

 - Abu Zakaria virá salvar-nos. Olhai que ele não é o Trava!

Não gostei daquela insinuação dirigida ao príncipe e preparava-me para a repreender, quando aquele, nada incomodado, afirmou:

 - Fátima, já lá vai o tempo em que lutava contra mulheres.

A rapariga, sempre de olhar desdenhoso, provocou-o:

 - - Com mulheres nunca vos dais bem! Haveis prendido vossa mãe, Chamoa fechou-se num mosteiro, Raimunda atirou-se ao rio e a normanda preferiu tomar conta das vossas irmãs!

- Adoro ver-vos zangada, bela Fátima!
                                                                                              

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