(Domingos Amaral)
Episódio Nº 27
- Várias vezes por ano, os dois trocavam
curtas mensagens, usando como cúmplice um ferreiro galego, à casa de quem o
Velho se começou a dirigir.
Porém, mal virou para a rua lateral à Sé,
chocou com a princesa Zaida que saía da biblioteca, muito apressada, e quase
deu um trambolhão à sua frente.
Desculpai-me, murmurou o Velho
atrapalhado.
A princesa endireitou-se ajeitando as
roupas e escondendo algo no regaço. Parecia, claramente, comprometida, como se
estivesse a fazer o que não devia.
A pergunta que lhe dirigiu foi mais uma
tentativa de dissipar a desconfiança dele do que uma verdadeira preocupação com
a sua saúde:
-
Estais bem? – Pareceis doente...
O Velho limitou-se a encolher os ombros:
- A
velhice não tem cura.
A princesa forçou um sorriso e depois
seguiu o seu caminho, enquanto o Velho permanecia parado, pois ainda não
acreditava no que tinha visto debaixo da túnica da princesa.
Ela bem tentara esconder um objecto, mas
ele tinha bom olho, e o que ela levava era de grande valor. Decidiu segui-la,
talvez tivesse um momento de sorte.
Agitada, Zaida, foi à casa onde vivia,
entrou, mas poço depois voltou a sair e regressou à biblioteca da Sé, sem nada
no regaço.
Durante algum tempo o Velho esperou mas
ela não reapareceu.
Então, deu meia volta e dirigiu-se à casa
das princesas. Se conseguisse roubar aquele objecto, certamente que o Trava
iria ficar muito contente.
Fora por essas e por outras, que Fernão
Peres lhe destinara uma missão tão difícil. Ele era o homem necessário, o
espião indicado.
Conhecia Soure e a região a sul da
povoação pois no passado já fizera parte da guarnição do castelo, na época dos
cercos realizados a Coimbra pelo califa almorávida Ali Yusuf.
Desde essa longínqua data que era um fiel
soldado de Fernão Peres de Trava acompanhando as andanças do amo. Por isso,
aceitara aquele rept o, em Viseu, na
Páscoa de há seis anos, quando o nobre galego lhe explicou que uma nova Ordem
religiosa iria reconstruir o castelo de Soure e procurar uma relíqui a sagrada.
Sois os meus olhos e os meus ouvidos –
dissera o Trava.
Apresentando-se como um combatente caído
em desgraça, o Velho alistara-se no primeiro contingente de monges guerreiros
da Ordem do Templo, onde já estavam o Rato e o Peida Gorda e aos quais se
somara, dias depois, o jovem Ramiro, bastardo de Paio Soares.
O grupo havia iniciado a recuperação de
Soure e, durante seis verões e seis invernos, o Velho permanecera por lá.
A sinistra mulher de negro eclipsara-se e,
portanto, o Velho, limitara-se a fazer o seu trabalho secreto para o trava,
informando-o sobre o que se passava na região.
Apenas por uma vez, a bruxa Sohba, por
quem nutria um forte ódio, pois um dia ela atirara-lhe uma bola de fogo, quase
o cegando. Desde essa data jurara matá-la mal tivesse uma oportunidade, só que
esta não surgira.
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