(Domingos Amaral)
Episódio Nº 26
É tempo de morrer em paz. Vou para casa.
Os outros não conheciam a
sua terra mas o Velho anunciou que iria para o norte e Ramiro aceitou a decisão
dele pois não se devia contrariar um homem daquela idade.
Ele tinha o direito de
falecer onde desejasse e o bastardo de paio Soares decidiu que o acompanharia
até Coimbra onde iria reportar a Afonso Henriques a macabra descoberta que tinha
feito nas margens do Nabão.
Na madrugada seguinte, em
Soure, o Velho despediu-se emocionado dos seus companheiros templários e Ramiro
mandou-o subir para o seu cavalo.
Estavam curtos de animais,
iriam os dois juntos, como faziam os Pobres Cavaleiros de Cristo na Terra
Santa.
Enciumado por os ver tão
próximos, o Rato atirou-lhes um adeus e avisou Ramiro que tivesses cuidado no
regresso, temendo uma emboscada sarracena. Porém, o bastardo de Paio Soares nem
reagiu.
No calor das suas
clandestinas ternuras, Ramiro garantia sempre ao Rato que, depois das surras
que o pai lhe dera em criança, nunca mais tivera medo de nada nem de ninguém.
Coimbra, Julho de 1132
Ramiro ajudou o Velho a
desmontar, no pátio em frente da Sé, sentindo que em seis anos de convívio se
forjara entre eles uma lealdade verdadeira.
Agora, os seus caminhos
divergiam, embora o Velho parecesse já arrependido da decisão que tomara. Em
voz pesarosa, reconheceu que iria sentir saudades da camaradagem da Ordem do
Templo.
Ramiro confortou-o e depois
de um abraço final subiu pelas escadas de granito da igreja de Coimbra.
Em passo lento, o Velho
afastou-se curvado, arrastando os pés, mas uns metros à frente já sorria,
embora se tenha mantido encolhido, não fosse alguém vê-lo.
O seu talento para a
mistificação continuava intacto, enganara bem os colegas. Aproveitando um
momento de distracção destes, simulara uma queda desamparada, fingira-se
abalado e dorido e apresentara a decisão da partida como inevitável.
Por respeito, os companheiros
aceitaram-na, crédulos como sempre. Ninguém desconfiara dele e, ao longo de
seis anos, fizera por isso.
Alistara-se naquela Ordem a
mando de Fernão Peres de Trava que era o seu senhor e lhe dera instruções para
se manter vigilante em Soure. O Trava
queria um homem da sua confiança integrado secretamente naquela congregação,
para acompanhar a busca da relíqui a
sagrada trazida pelo conde Henrique da Terra Santa.
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