e a
Mentira
Pedro
Almodôvar, esse talentoso cineasta espanhol, quando tinha nove anos, no início
dos anos 60, mudou-se com a família da aldeia da Mancha, onde nasceu, para uma
outra na Estremadura, onde a maioria dos habitantes eram analfabetos, o que foi
identificado como uma oportunidade de negócio pela mãe, que logo montou, em
sociedade com o filho, um comércio de leitura e escrita de cartas.
Como tinha uma caligrafia muito
bonita, ele escrevia as cartas, enquanto a mãe se encarregava da leitura.
Cedo,
Pedro começou a reparar que a mãe romanceava o que estava escrito nas cartas, e
um dia não se conteve e perguntou-lhe:
- Por que lhe disseste que ela sente
saudades da avó e se lembra muitas vezes dela a lavar a roupa numa bacia cheia
de água à porta de casa, se na carta nem sequer fala na avó?
Ao que a mãe o calou com uma resposta
desarmante:
- Mas viste como a avó ficou
contente?!!!
“A realidade precisa da ficção para
ser mais completa, mais agradável, mais vivida” escrevia o cineasta no dia a
seguir ao da morte da mãe.
Um sábio de outro século, de outra
arte e de outra geografia, Fiodor Dostoievski tinha chegado à mesma conclusão
quando nos avisou:
- “Para tornar a realidade mais
verosímil precisamos necessariamente de adicionar a mentira”
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