quinta-feira, julho 30, 2009


TIETA DO AGRESTE
EPISÓDIO Nº 194






Elisa, por exemplo, não falta. Elegantíssima, aparenta ar distante e indiferente como se comparecesse apenas para cumprir dever de esposa incentivando Astério. Em realidade aproveita a ocasião para sentir o odor pecaminoso do bar onde, na parede principal, entre garrafas e bebidas, foram coladas as folhas de um calendário de mulheres nuas, loiras, nórdicas, morenas, orientais, mulatas, uma para cada mês, oferta de Aminthas ao amigo Manuel, lusitano viúvo, lúbrico e esteta, conforme se lê na dedicatória. Segundo Osnar, o sargento Peto comeu as doze, uma a uma, na punheta. Ele e seu Manuel.

Comparecem as primas de Seixas, rebanho garrido e alegre. Dona Edna não perde uma só partida, nem mesmo agora quando seus campeões já se encontram fora do páreo; o moço Leléu, que mais parece seu marido e Terto que, como se sabe de sobejo, sendo esposo de papel passado, não convence. Derrotados os dois, vacila dona Edna na escolha de um novo predilecto entre os quatro semifinalistas. Talvez se decida por Astério, para aperrear Elisa, metida a esnobe e a rainha da elegância – elegância de segunda mão, de vestidos usados, de refugos.

Vacilam algumas outras espectadoras. A maioria, porém, constitui a imbatível torcida de Fidélio, animadíssima, formada por donzelas de diferentes idades, indo de jovens alunas do colégio de dona Carlota (Antunes) Alves à quase solteirona Cinira. Calado, enrustido, na aparência um monge e cheio de admiradoras: um tipo surpreendente esse Fidélio A., ou seja Antunes.

Ascânio estende o convite a Tieta. Ela recusa: acertada a escritura da propriedade de Jarde e Josafá, pouco lhe resta fazer em Agreste. No dia seguinte, sem falta, irá para Mangue Seco. Não vai pela manhã porque prometera a dona Milú almoçar com ela. Imediatamente depois o solão do começo da tarde na lancha de Elieser, levando Ricardo consigo para a arrancada final na construção do Curral do Bode Inácio: a pintura e o pavimento.

- Torneio de bilhar? Não meu filho, prefiro o banho de mar na praia e o banho da lua nos combros de Mangue Seco. – Espreguiça-se a prelibar tais delícias. – Ademais, quero gozar da minha biboca antes de ir embora.

- Ir embora? Só depois da inauguração da luz, não se esqueça – de tão eufórico, Ascânio solta a língua: - Estou preparando uma surpresa para a senhora.

- Para mim? Diga logo o que é.

- Me desculpe dona Antonieta mas não posso. Penso que a senhora vai gostar.

Gostaria, isso sim, que ele perdesse o acanhamento e agarrasse Leonora, levando-a para a cama. O jeito é empurrá-lo, precipitando os acontecimentos.

Mais uns dias e a biboca estará pronta, mando buscar Nora para ficar lá comigo.

Para ficar em Mangue Seco? – empalidece Ascânio, treme-lhe a voz, de súbito esvaziado de euforia e entusiasmo.

Exactamente como previra Tieta. Em Mangue Seco, no fim da semana, ela tirará da cabeça do rapaz a funesta ideia de permitir a instalação no coqueiral de indústria recusada em todas as partes do mundo, rechaçada com horror, ameaça mortal para o clima e as águas de Agreste. Em troca o colocará no leito de Leonora, o leito mais sumptuoso do mundo, as dunas de Mangue Seco, livres da poluição.

- Venha você também, o Curral é pequeno mas se dando um jeitinho cabem as cabras e os bodes.

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