quinta-feira, novembro 18, 2010

DONA
FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS


Episódio Nº 273



Costumava vir fazer macaquices, obrigando dona flor a morder os lábios para não rir quando, metido na camisa de mulheres nuas, saía bailando e se exibindo; ou para não se irritar a vê-lo por detrás da cadeira do doutor a lhe pôr chifres na testa com os dedos, o pervertido!

Chifres inexistentes, pois ela não se dera, guardara incólume o reduto onde a honra verdadeira se contém (o resto era bobagem, como Vadinho lhe dizia e como sabem quantos dessas coisas já trataram).

Esperou até à hora de dormir, ele não veio. Certamente, Vadinho partira ofendido, era orgulhoso e duro, capaz de enfrentar de cabeça erguida a provação mais rude. Quem sabe, partira para sempre. Ai, meu Deus, nem sequer se despedira.


A desaparição de Vadinho ocorrera na quarta-feira pela manhã e dona Flor passou o dis desarvorada, na aflição de não o ver, no receio de tê-lo novamente perdido e no contraditório desejo de que assim fosse, pois, ela o sabia, só essa partida definitiva, para sempre e nunca mais, era capaz de lhe salvar o lar feliz.

Ora, nas noites das quarta-feiras, assim como na dos sábados, como já se disse e repetiu, o metódico doutor honrava a esposa e dela se servia, cumprindo prazeroso suas obrigações matrimoniais, grata tarefa. Com bis aos sábados, (não nos esqueçamos) e com o mesmo ritual de sempre, onde o prazer não excluía o respeito, um prazer envolto em pudicícia, coberto com o recato (e com o lenço).

Após o desacerto da noite do aniversário de casamento, noite do retorno de Vadinho, as relações de cama entre dona Flor e doutor Teodoro reencontraram a sua normalidade, dona Flor dando-se ao esposo com modéstia e com ternura, e dele recebendo total e plena satisfação, aos sábados repetida.

Aliás, dona Flor nunca fora tão viva no prazer com o bravo farmacêutico como ultimamente; em verdade entregava-se agora com mais ternura do que modéstia, o doutor a sentia ansiosa e apaixonada, perdendo por vezes a contenção discreta, pondo-se a gemer e a suspirar, num assanhamento.

Alegrava-se o doutor com tais provas de amor e de satisfação. Engrandecia-se o amor de sua esposa com o passar do tempo, e também ele a amava mais, se era possível.

Houve mesmo uma noite de folgança extra, fora do estrito calendário, a noite daquele dia em que se completaram os trâmites no banco de Celestino e no cartório de Marback, para a compra da casa. Esse festejo do acontecimento, o doutor o cumpriu feliz, achando justo romper, por tal motivo, a sistemática ordenação da vida nocturna do casal.

Ele próprio, ao sair naquela tarde do quarto para a sala, o braço na cintura de dona Flor, a cabeça da esposa em seu ombro reclinada, e ao perceber o sorriso malicioso de dona Norma, sentira o apelo do amor disperso no ambiente, vindo de dona Flor e comovendo-o. Ele próprio pensara em celebrar a data considerando que “uma extravagância uma vez na vida outra na morte não chega não chega a ser abuso nem ameaça à saúde física ou moral dos cônjuges (desde que não se converta em hábito, evidentemente)”.

Se a compra da casa influíra sobre dona Flor, levando-a a provocar o esposo e a obter sua aquiescência e colaboração naquele extra ela não se dera conta.

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