terça-feira, dezembro 28, 2010

DONA

FLOR
E SEUS
DOIS
MARIDOS


Episódio Nº 305


- Onde posso encontrar esse cavalheiro?

Velho de mais de oitenta anos, desde os vinte e poucos a anunciar o fim do mundo, resistindo à descrença e à perseguição, à cadeia e ao hospício, jamais vencido, implacável profeta do Velho Testamento, Teobaldo príncipe de Bagdá esclareceu:

- Onde menos se espera ele se encontra… - e tendo dito, fechou os olhos e pegou no sono.

No apartamento de Zulmira, na solidão propícia ao pensador, Cardoso e S.ª punha em ordem os últimos detalhes do seu plano de combate: já marcara entrevista com os marcianos, tinha amigos entre eles.

- E então? – perguntou a Pelancchi.

Cansado e pessimista, o rei do jogo ergueu os ombros:

- Por acaso você sabe onde posso achar o tal Mestre do Absurdo? Já ouviu falar?

- O Mestre do Absurdo? Quer encontrar com ele – a gargalhada do místico sacudiu a sala.

- Com urgência.

- Pois aqui o tem, em sua frente. Eu sou o Mestre do Absurdo.

No bacará, no lasquinê, no grande e pequeno, na roleta, Arigof, Anacreon, Giovanni Guimarães e a multidão a seguir os seus palpites, estouravam bancas sobre bancas, jamais perdiam. Nem uma só vez.

- Você? Pois ande depressa. Se durar mais uma semana estou falido.

- Depressa, Cardosinho – suplicou também Zulmira.

O Mestre do Absurdo sorriu ao tratamento íntimo e à zelosa secretária:

- Fiquem descansados, é para já.

“Olhar de águia, irresistível”, pensou Zulmira.



De braço dado chegaram da farmácia dona Flor e doutor Teodoro na hora do jantar. Ele, após breve repouso, voltaria ao trabalho, prolongando-se o plantão até às dez da noite, estafante.

- Pobre querido… - disse dona Flor.

- Você hoje vai dormir cedo, minha querida, ontem estava febril – recomendou o bom marido.

Dona Flor tão satisfeita, de repente inteira e uniforme, não mais contraditória, dividida ao meio, em luta o espírito e a matéria. Apenas um temor: se ele não voltasse, o seu primeiro? Se não viesse?

Mas ele veio, e apenas o doutor se foi para a farmácia (de capa e guarda-chuva, pois de novo aumentara o aguaceiro), eis dona Flor e Vadinho no leito de ferro, sobre o colchão de molas, a vadiar.

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