segunda-feira, dezembro 27, 2010

INFORMAÇÕES ADICIONAIS
À ENTREVISTA Nº 76 SOB O TEMA:
“A EVANGELIZAÇÂO DA AMÉRICA LATINA?” (2)


Cinco Séculos Depois: Um Discurso Insultante.

No discurso com que inaugurou a Conferência de Bispos Latino Americanos e do Caribe, em Aparecida, no Brasil, em Maio de 2007, o Papa Bento XVI referiu-se ao processo de Cristianização da América sem incluir uma única palavra de crítica àqueles factos históricos.

Nesse discurso, ele expressou a visão oficial insensível da Igreja Católica daquele sangrento processo histórico.

As passagens desse discurso que mais polémica e rejeição provocaram por toda a América Latina foram estas:

-“Que significou a aceitação da fé cristã para os povos da América Latina e do Caribe? Para eles significou conhecer e acolher Cristo, o Deus desconhecido que os seus antepassados, sem o saberem, buscavam nas suas ricas tradições religiosas. Cristo era o Salvador que ansiavam silenciosamente. O Espírito Santo veio fecundar as suas culturas, purificando-as e desenvolvendo os numerosos germens e sementes que o Verbo encarnado havia posto nelas, orientando-as assim pelos caminhos dos Evangelhos. O anúncio de Jesus e do seu Evangelho não supôs, em nenhum momento, a alienação das culturas pré-colombianas, nem foi uma imposição de uma cultura estranha…”



Um Dos Genocídio Mais Horrorosos


Entre as muitas expressões de repúdio ao discurso do Papa destacamos uma, a da “Posição da Confederação dos Povos de Nacionalidade Kichwa do Equador”, emitido dois dias apenas as palavras provocadoras do pontífice.

Eis uma passagem desse texto:

- “Se analisarmos com uma elementar sensibilidade humana, sem fanatismos de nenhuma espécie, a história da invasão a Abya Yala (nome dado ao Continente Americano) realizado pelos espanhóis com a cumplicidade da igreja católica, só nos podemos indignar.

Seguramente que o Papa desconhece que os representantes da igreja católica desse tempo, com honrosas excepções, foram cúmplices, encobridores e beneficiários de um dos genocídios mais horrorosos que a humanidade podia presenciar.

Mais de 70 milhões de mortos em campos de concentração de minas (a actividade de mineração foi a mais importante da América Espanhola). Nações e povos inteiros foram arrasados e para substituir os mortos trouxeram povos do continente africano que sofreram a mesma desgraçada sorte.

Usurparam as riquezas dos nossos territórios para salvar economicamente o sistema feudal. As mulheres foram cobardemente violadas e milhares de crianças morreram por desnutrição e doenças desconhecidas. Tudo isto foi feito debaixo do pressuposto filosófico e teológico que os nossos antepassados “não tinham alma”.

Junto dos assassinos dos nossos heróicos dirigentes estava sempre um sacerdote ou um bispo para doutrinar o condenado ou condenada à morte, baptizando-os antes de morrer, renunciando, assim, às suas concepções filosóficas e teológicas…

Não é concebível que em pleno Séc. XXI se acredite na Europa que só pode ser concebido como Deus um ser definido com tal na Europa. O Papa devia saber que antes de chegarem aos nossos territórios os sacerdotes católicos com a Bíblia, nos nossos povos já existia deus e a sua Palavra é aquela que sempre sustentou a vida dos nossos povos e a da Mãe Terra. A palavra de Deus não pode estar contida num só livro e muito menos se pode acreditar que uma religião possa privatizar um Deus.

Os nossos povos originários eram civilizações que tinham governos e organizações sociais estruturadas de acordo com os nossos princípios. Naturalmente, também tínhamos religiões com livros sagrados, ritos, sacerdotes e sacerdotisas que foram os primeiros a serem assassinados pelos que se afirmavam ser servidores do Deus do Amor de que falava Jesus Cristo mas não passaram de servidores do “deus da codícia”.

É importante comunicar ao Papa que as nossas religiões jamais morreram. Aprendemos a sincretizar nossas crenças e símbolos com as dos invasores e opressores. Continuamos assistindo nos nossos templos porque sabemos que debaixo dos principais templos católicos estão os cimentos dos nossos templos sagrados que foram destruídos no pressuposto de que as novas construções sepultariam as nossas crenças.


Mas não é assim, já que os nossos templos foram edificados em lugares onde se concentram grandes Forças que reflectem a Força, Sabedoria e Amor do Grande Espírito Pai e Mãe de todos os seres que habitam neste maravilhoso planeta”.


Que dizer mais? Notável este texto pela saberdoria e humildade inteligente em resposta à sobranceria das palavras do pontífice.

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