quinta-feira, abril 21, 2011

TEREZA


BATISTA


CANSADA


DE


GUERRA


Episódio Nº 87


Desejasse Tereza estabelecer relações amistosas com meeiros e cabras e as poucas mulheres, e não seria fácil. Rapariga do capitão, dormindo na cama de casal, dela todos se afastam no temor da ira fácil de Justiniano Duarte da Rosa. Protegida sua não era para andar de conversa fiada, de dentes abertos. Vários dos moradores testemunharam o acontecido com Jonga, os outros sabiam de ouvir. Jonga escapara com vida, felizardo. Celina pagou a conversa e o riso na bainha do facão, quando aportou na Cuia Dágua dava para olhar. Mulher do capitão é perigo de morte, doença contagiosa, veneno de cobra.

Por duas vezes o capitão a levou na anca da montaria às brigas de galo. Vaidoso de seus galos e da quenga bonita, no prazer de causar inveja aos demais. Maços de dinheiro no bolso para as apostas, os cabras em redor, punhais e revólveres. Na rinha, os galos em sangue, esporões de ferro, peitos despenados, a cabeça borrifada de cachaça. Tereza apertara os olhos para não ver, o capitão deu-lhe ordens de ver – espectáculo mais emocionante não pode existir – dizem que tourada ainda é melhor, duvido!, só vendo para crer. Nas duas vezes os galos do capitão perderam feio, derrotas sem precedentes, inexplicáveis. Devia haver uma explicação, um culpado; culpa de Tereza, é claro, com aqueles olhos de censura e piedade, o grito de agonia quando o galo caiu, estrebuchando, no peito um esguicho de sangue.

Todo galista sabe como é fatal para campeão empenhado em combate a presença entre a assistência de um choramingas, homem ou mulher. Urucubaca sem jeito. Na primeira vez, Justiniano contentou-se com uns xingos e uns tabefes; para ensiná-la a apreciar e incentivar os galos.

Na reprise aplicou-lhe surra das boas, para curar-lhe o azar e descontar o dinheiro perdido nas apostas, a decepção da derrota. Nunca mais a levou na garupa do cavalo e lhe proibiu as rinhas de galo; como pode alguém não gostar de combate de galos, ser assim tão molengas?

Tereza considerou a surra preço barato pela inesperada libertação. Preferia, nas raras horas de folga, catar os piolhos de Guga, matar-lhe as lêndeas.

Assim, em pânico, transcorreram dois anos da vida de Tereza, na casa da roça. Um dia o capitão a surpreendeu rabiscando papel com uma ponta de lápis. Tomou-lhe papel e lápis:

- De quem é essa letra?

No papel Tereza garatujara o próprio nome, Tereza Batista da Anunciação, o da Escola Tobias Barreto e o da professora Mercedes Lima.

- Minha, sim senhora.

Lembrou-se o capitão de ter ouvido Filipa louvar escrita e leitura da menina, na hora da transacção, valorizando o artigo à venda, mas não ligara, interessado somente no cabaço.

- Tu sabe fazer conta?

- Sei, sim senhor.

- As quatro?

- Sim, senhor.

Dias depois, Tereza foi transferida para a casa da cidade, sua trouxa posta no quarto do capitão. Não levou saudades da roça, nem mesmo de Guga com sua chaga aberta e seus piolhos. No armazém substituiu um rapaz que emigrara para o Sul, o único capaz das quatro operações. (clik na imagem)

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