quarta-feira, maio 04, 2011

TEREZA

BATISTA


CANSADA


DE


GUERRA


Episódio Nº 98




- Preocupada? Por quê? Conte tudo, Teó, pela alma da nossa mãe.

- Ainda não vieram. Se não vierem, me mato, juro.

- Não diga tolice. O que é que não veio ainda? Me diga, pelo amor de deus.

- Minhas regras este mês.

- Estão muito atrasadas?

Atrasadas de dias e os seios doíam-lhe, certos sintomas, Magda. Magda reuniu em segredo as irmãs, Teó está grávida, manas, uma tragédia, o que devemos fazer? Fala em matar-se, é capaz de tudo, uma desmiolada. Acontecesse com estranha, disse Amália, e acharia bem feito, provou do bom e do melhor, pois que pague, mas se tratando de Teó parece-lhe necessário chamar a parteira Noquinha, perita fazedora de anjos, Noquinha?

Perita, sem dúvida, mas linguaruda, incapaz de descrição, objectou Magda; não será melhor doutor David, médico da família?

Nem Noquinha, nem doutor David, na opinião de Berta: Teó está nos querendo fazer de bobas, para a gente pensar que a coisa se deu. E você acha que não se deu? Acho, sim; não deu, não comeu, não meteu. Basta, ordenou Magda, a mais velha, esperemos então.

Durou pouco o suspense, as regras vieram, mas Teodora permaneceu ambígua, distante e grave, com aquele ar de superioridade de quem possui um passado e um segredo; as irmãs continuaram na incerteza e na inveja, a discutir o assunto. A cidade também, até hoje a dúvida perdura. Teodora na janela em devaneio, olhos ao longe, suspiros. Dos enigmas de Cajazeiras, o mais apaixonante.

O armazém do capitão Justo constituía a mais permanente diversão das quatro irmãs nas janelas do primeiro andar a controlar a freguesia, anotando o volume de compras, respondendo aos cumprimentos, matando o tempo infinito das vitalinas. Ultimamente o movimento aumentara, crescera a freguesia masculina.

Magda, a pretexto de ocupações inadiáveis da empregada, foi em pessoa às compras, esclareceu o motivo da romaria. Deu-se conta ao entrar: curiosidade em torno da moça em somar parcelas, rapariga do capitão. Moleca nova, de cabelo escorrido e cara assustada, assim a descreveu Magda às irmãs, e não deixava de ser uma descrição correcta. Com o tempo, a curiosidade diminuiu, apenas Marcos Lemos afreguesara-se, comprando cigarros pela manhã, fósforos á tarde ao voltar do escritório da usina.

Quando Daniel foi visto pela primeira vez estudando com atenção as venezianas das janelas, as quatro irmãs estremeceram nos alicerces. Pôs-se Magda ao piano, encheu o ar de valsas; Amália temperou a voz, Berta temperou as tintas da aguarela, Teodora plantou-se na janela, vestida de festa e de esperança.

Impossível homem mais bonito e cavalheiro. Educadíssimo, não fosse estudante na capital e filho do doutor juiz: tendo a tímida Amália chegado à porta da rua, para salvar dos perigos da liberdade o gato Mimoso, capado e obeso, ainda assim devasso e rueiro – dera em chibungo – Daniel cortou o caminho do fujão, entregando-o nas mãos de Amália desfalecente. Largos cumprimentos, sorrisos e olhares saudaram Magda e Berta quando se ficaram a ver nas janelas; agradeceu com palavras de poeta o copo com água fresca solicitado à empregada e pessoalmente
servido por Teodora.

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