terça-feira, maio 03, 2011

TEREZA

BATISTA

CANSADA

DE



GUERRA



Episódio Nº 97


Péssima a fama do capitão. Atrabiliário, violento, brigão, maus bofes e maus instintos. Embora precavido, inimigo de encrencas, Daniel não se alarmou com as informações de Marcos Lemos, exageros do simpático guarda-livros. Dan confiava em sua constante boa estrela e na experiência de casos anteriores, não acreditando fosse o valentão dar maior importância ao comportamento de uma das suas muitas, como dizer, Daniel?, digamos raparigas, palavra de ilimitado conceito, pois tão mísero afecto lhe dedicava a ponto de ter, além dela, duas e três ao mesmo tempo, na roça, nas pensões, em cantos de rua, inclusivé ali nos fundos do armazém, nas fuças da moça.

E porque diabo haveria o capitão de saber? Prudência e cautela serão necessárias; de prudente e cauteloso Daniel possui diploma de doutor. No presente episódio houve ademais a ajuda das circunstâncias, a estrela de Dan não lhe faltou.

Bem fronteiro ao armazém, elevava-se o chalé das Morais, uma das melhores residenciais da cidade, habitada por quatro irmãs, remanescentes de clã outrora poderoso, herdeiras de casa de aluguel e de acções da fazenda federal. Alegres, apatacadas, bonitas, perfeitas donas de casa, vivessem na capital e de certo não lhe faltariam pretendentes à mão e ao dote. Ali, no entanto, andando a mais velha pelos vinte e oito anos e a mais moça pelos vinte e dois, estiolavam-se, fadadas ao barricão, sem outras perspectivas, além de festas de igreja, das novenas e trezenas, dos presépios de Natal da confecção de bolos e doces. Antes, é claro, daquelas férias de Junho e da aparição de Dan na calçada fronteira.

Magda, a mais velha, arranhava piano, estudara com as freiras; Amália declamava “Meus Oito Anos”, “As Pombas”, “In Extremis”, com muita expressão; Berta copiava paisagens com lápis de cor e aguarela, podem ser vistas nas paredes do chalé e em casa de famílias amigas; Teodora tivera um caso com o famoso malabarista grego do Grande Circo do Oriente, trocaram beijos e alianças ao luar e, no escuro, e ela primeiro falara em fugir, depois em matar-se, quando o galã conduzido à delegacia para esclarecimentos (a rogo de Magda, feito em segredo ao delegado, mas que ninguém jamais saiba, se chegar aos ouvidos de Teodora a indébita intervenção da primogénita, o mundo virá abaixo), posto contra a parede e sob a ameaça de couro confessou-se nacional e casado, embora traído e abandonado pela mulher.

Pífio depoimento de melancolias, apesar dele talvez Teodora mandasse às favas a honra da família e seguisse o aflito artista na sedutora esteira do mambembe, se o ateniense de Cataguases não houvesse picado a mula na calada da noite sem esperar o desmonte do pavilhão do circo.

Romântico episódio, comovera a cidade. Idílio curto, porém intenso, os dois amorosos em toda a parte, em exibições de ternura, Teodora indócil a conselhos e ralhos, sonhos de amor findando em anedota, ainda hoje permanece uma dúvida a desafiar a argúcia das comadres: o rei internacional dos jogos malabares (assim constava dos programas do circo) chamara aos peitos a jovem Teodora, aliviando-a dos tampos, ou permanecera ela virgem, incólume, honrada, no ora veja? Nem mesmo as irmãs mortas de vontade de saber o sabiam, pois a maior interessada em exibir-se sem mancha, pura e íntegra, a própria Teodora, mantinha a dúvida, respondendo com meias palavras, com risinhos dúbios, com suspiros fundos a qualquer insinuação ou tentativa de esclarecimento.
Ameaçando suicídio, logo após a partida do circo, alarmara Magda:
- Sabe, Magda, estou preocupada. Não diga nada às manas.
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