segunda-feira, maio 02, 2011

TEREZA


BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA
Episódio Nº 96


Daniel é mestre em tais matérias, merece fé. Mas nesse interior de fazendeiros e jagunços onde a civilização ainda não chegou, é aconselhável evitar senhoras casadas numa prova de respeito à família legalmente constituída e de prudência.

Em compensação existem as amigadas – amásias, concubinas, moças, mancebas, comborças, amigas. Não implicando a amigação em compromissos de honra assumidos ante juiz e sacerdote, apenas juras de amor e tratos de dinheiro, é quase nulo o perigo de escândalo, menor ainda o de violência. Quem vai armar escândalo por causa de amásia, matar por concubina?

Segundo os códigos de Daniel, em tal condição não se pode arguir com lar desfeito, honra ofendida.

Rápido exame na classe das amásias locais revelara de imediato o mau gosto predominante: valorização excessiva da gordura como elemento de beleza e exigência de variadas prendas domésticas sobretudo as referentes ao domínio da culinária, boa amásia deve ser cozinheira de mãos de fada. Dignas de atenção apenas três, sendo que a uma delas não se podia aplicar com justeza a designação de amiga, doce apelo, ou qualquer dos seus sinónimos; mais bem uma criada, moleca nos lençóis e no capricho do patrão.

A primeira, mulata branca de muita classe, de rija carnação, embora cheia de corpo, alva na cor, negra nos traços, boca gulosa em rosto sereno, certamente fina de cama – percebe-se pelo molejo das ancas – era há mais de um lustre a verdadeira esposa do colector Aírton Amorim, estando a outra paralítica numa cadeira de rodas; dificilmente poria em jogo a excelente posição alcançada e a perspectiva de comparecer ante o padre e o juiz assim lhe favorecesse nossa Senhora do Ó, de quem é fervente devota, fazendo jeito da primeira desimpedir quanto antes o beco, levando-a dessa para a melhor, afinal, mãe do Céu, passar o dia numa cadeira de rodas, entrevada, sem falar, sem se mexer, enxergando apenas uma réstia de luz, não é vida para ninguém, e a dita cuja só não entrega os pontos de ruim, para aporrinhar.

A segunda, também de visível competência, tinha sabor de incesto, pois se tratava de Belinha, manceba do juiz. De longe, Marcos Lemos a apontara na rua por onde vinha de sombrinha e criada para o dentista talvez. Daniel adiantou-se para com ela cruzar e observá-la de perto; Belinha apurando o caminhar maneiro, suspendeu os olhos ariscos para melhor reconhecer o filho do juiz. Daniel sorriu-lhe gentil e a cumprimentou: a bênção, Mamãe. Ela não respondeu, mas achou graça num riso manso e, de olhos baixos, rebolando a bunda, se foi.



Nas ausências do meritíssimo, consolava-se com um primo, assuntos de família, capazes de tentar o estudante em férias da Faculdade e da agitada vida da capital, não fosse a moleca do capitão um sonho de menina, junto a elas as demais não existiam, como medrara em terra assim agreste flor tão esplêndida? Marcos Lemos, na vaidade de cicerone do simpático jovem, não resistira e revelara a presença daquela gata borralheira (dera o título de Gata Borralheira a um madrigal inspirado em Tereza) amásia do capitão. Amásia exactamente não, apenas um dos muitos caprichos de Justiniano Duarte da Rosa.

Daniel pôs os olhos nela, ficou maluco, suas
paixões eram fogaréus arrasadores. (clik na imagem)

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