sexta-feira, junho 10, 2011

TEREZA

BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA







Episódio Nº 123







- Tereza! – A voz de ameaça.

- Estou indo.

Estende-lhe os pés, ela desamarra os sapatos, tira-lhe as meias, trás a bacia com água. Pés gordos, suados, unhas sujas, aftim penetrante, sola de calos. Os pés de Daniel são asas de voar, de elevar-se no ar, magros, limpos, secos, perfumados.

Fugir com ele, impossível. Filho do juiz, moço de cidade grande, estudante, quase doutor, nem para rapariga nem para criada lhe serviria; na capital tem aos montes, à sua escolha. Mas dizia-lhe meu amor, minha querida, nunca vi outra tão bela, de ti nunca me cansarei, quero-te para a vida toda; porque lhe diria, se não fosse verdade?

Lava os pés do capitão com eficiência e presteza, precisa mantê-lo sem um vislumbre sequer de desconfiança para que não desfaça a viagem à Bahia, não coloque cabras na tocaia, não traga o ferro de marcar rezes, vacas e bois, mulheres traidoras. Tereza ouvira-o dizer na rinha de galos onde a levara para exibi-la:

- Se um dia uma infeliz tivesse a audácia de me enganar, e nenhuma terá, antes de dar fim à desgraçada, marcava ela na cara e no xibiu com o meu ferro de ferrar gado para lhe ensinar o nome do dono. Morria sabendo.

O capitão despe o paletó, retira do cinto o punhal e o revólver. Nessa manhã de São João comera sobejo da usina, a sonsa tinha bom remelexo, empenho e gosto no balancé.

Roxinha sapeca, própria para uma hora de folgança, para variar, pois está na variação a graça da brincadeira. Não para se ter em cama de casal, note e dia, a qualquer momento, anos a fio.

Um dia, quando venha a cansar da moleca Tereza, e há-de suceder com certeza mais cedo ou mais tarde, ele a enviará de presente ao doutor Emiliano Guedes, de prócer para prócer – receba e coma, doutor, o sobejo de capitão. Por ora não, junto aos Guedes é um Zé-ninguém e, mesmo assim, cansado, chegando de uma noite de dança contínua e de muita cachaça, a manhã toda em cima de fêmea assanhada, apenas bate os olhos em Tereza Batista acendem-se-lhe os ovos e responde a caceta.

- Prá cama, depressa.

Suspende-lhe o vestido, arranca-lhe a calçola, desabotoa a braguilha e sobe em Tereza. Que se passa com ela? Ficou donzela de novo, nasceu-lhe outro cabaço? Permanecera sempre estreita fenda, virtude peregrina, não há nada no mundo pior que mulher frouxa. Cara feia e corpo imperfeito não importam, por tão pouco não se retira o capitão de um bom combate. Mas não tolera mulher de bocal aberto, porteira de trem de ferro, tacho de canjica. Fresta apertada, trabalhosa passagem, greta de porta, assim se mantivera Tereza. Mas agora de todo fechada, nem fenda, nem fresta, nem greta, cabaçuda de novo.

Perito no trato de donzelas vai em frente o capitão, Tereza vale duas argolas no colar dos
cabaços; não enxerga os lampejos de ódio nos olhos de medo, negros de carvão.

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