quarta-feira, setembro 28, 2011

TEREZA

BATISTA
CANDADA
DE
GUERRA





Episódio Nº 216



Durante o jantar, no dia seguinte, Tereza acompanha o esforço do doutor para ser o perfeito anfitrião de sempre, para manter a mesa cordial e animada.

A comida admirável, os vinhos escolhidos, a dona da casa formosa, elegante e atenta, tudo do melhor, mas falta a jovialidade, a força, a alegria de viver de Emiliano, contagiantes.

Daquela vez Tereza não conseguira tirar a cabeça do doutor dos problemas, dos arrepios, das amofinações, fazê-lo esquecer o mundo mais além dos limites de Estância.

Termina contudo por animar-se e rir o riso largo de homem satisfeito com a vida, ao fim do jantar, após o café, acesos os charutos, faltando apenas os licores e os conhaques, os digestivos. Havia sumido da sala, volta trazendo uma garrafa, nos olhos claros a malícia, na boca o riso.

- Mestre João se segure para não desmaiar, tenho uma surpresa… Sabe o que é isto aqui na minha mão? Veja, uma garrafa de Constantia, o Constantia de nosso Tempo.

A voz de Nascimento Filho se eleva, de repente jovem:

- Constantia? Não me diga! – Põe-se de pé, estende o braço:

- Deixe-me ver – As mãos trémulas, coloca os óculos para ler o rótulo, namora contra a luz a cor de ouro velho da bebida, sentencia:

- Você é um demónio, Emiliano. Onde arranjou?

Na emoção do amigo o doutor parece por fim ter esquecido as preocupações a deprimi-lo. Enquanto enche os cálices ele e mestre João discorrem sobre o vinho, imersos num mundo de lembranças.

No dia do baptizado de Emiliano, o vinho servido após a cerimónia fora Constantia. Os heróis de Balzac bebem Constantia nos romances da Comédia Humana, recorda Nascimento Filho, cujos olhos se gastaram na leitura. Frederico, o Grande, não o dispensava, acrescenta o doutor. Nem Napoleão, Luís Filipe, Bismark.

São dois velhos a sentirem o sabor da juventude no vinho espesso e escuro. O padre e o médico escutam em silêncio, os cálices cheios.

Saúde! – Brinda Emiliano. – À nossa, mestre João!

João Nascimento Filho cerra os olhos para melhor degustar: rapaz nas ruas da Bahia, na Faculdade de Direito, pleno de ambições literárias, antes de cair doente e ter de abandonar os estudos e as rodas boémias.

O doutor bebe devagar, saboreando: moço rico às voltas com amantes e festas, tentado pela advocacia e o jornalismo, jovem bacharel destinado a brilhante carreira. Sacrificara planos e esperanças à paixão por Isadora e não se arrependera.

Procura Tereza com os olhos, ela está a fitá-lo enternecida por vê-lo finalmente despreocupado, a rir com o amigo. Anda para ela. Que direito tem a fazê-la compartir os desgostos e tristezas apenas dele? Ela só lhe dera alegria, só merece amor.

- Gosta de Constantia, Favo-de-Mel?

- Gosto, sim, mas ainda prefiro o Porto.

- O vinho do Porto é o rei, Tereza. Não é, mestre João?
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