sexta-feira, outubro 14, 2011

TEREZA

BATISTA

CANSADA

DE

GUERRA






Episódio Nº 230




Na noite daquele domingo de Maio, Tereza deu-se conta da extensão do desastre, muito além do que ela pudera imaginar através das insinuações, das palavras soltas, das frases esparsas de amigos e estranhos, dos silêncios de Emiliano. Deve ter-lhe custado uma enormidade, manter-se cordial, amável, risonho, parecer alegre na convivência com ela e com os amigos, guardando para si somente a prova amarga, o fel a consumi-lo. De repente, foi demais e transbordou.

- Sangue ruim, raça ruim, degenerada.

Apenas duas pessoas entre os seus não o decepcionaram, não lhe traíram a confiança, Isadora e Tereza, com elas não se enganara. Fora pensando em Isadora, costureirinha pobre, esposa modelar, inesquecível companheira, que o usineiro decidira suspender as ordens dadas a Alfredão alusivas a Túlio Bocatelli, não matar o genro, conceder-lhe uma oportunidade.

- Sangue bom, Tereza, o da gente do povo. Quem me dera ser ainda jovem para ter de ti os filhos que sonhei.

Por abruptos caminhos chegaram às juras de amor, ao terno idílio. Após ter-lhe dito, com amargor, ira e paixão, o que jamais pensara confiar a parente, sócio ou amigo, o doutor a envolveu nos braços e, beijando-lhe os lábios, lastimou:

- Tarde demais, Tereza. Demorei a me dar conta. Tarde para os filhos mas não para viver. Só tenho a ti no mundo, Favo-de-Mel, como pude ser tão injusto e mesquinho?

- Injusto comigo? Mesquinho? Não fale assim, não é verdade. O senhor me deu de um tudo, quem era eu para merecer mais?

- Andando há pouco contigo no caminho do porto, subitamente me dei conta que se eu morresse hoje tu ficarias sem nada para viver, ainda mais pobre do que quando chegaste, pois agora tuas necessidades são maiores. Todo esse tempo, mais de seis anos e nunca pensei nisso. Não pensei em ti, só em mim, no prazer que me davas.

- Não diga isso, não quero ouvir.

- Amanhã de manhã vou telefonar mandando que Lulu venha imediatamente botar esta casa em teu nome e acrescentar uma cláusula em meu testamento, um legado que garanta tua vida após minha morte. Sou um velho, Tereza.

- Não fale assim, por favor… - Repete: - Por favor lhe peço.

- Está bem, não falo mais, mas vou tomar as providências necessárias. Para corrigir, ao menos em parte, a injustiça: tu me deste paz, alegria, amor, e eu, em troca, te mantive presa aqui, na dependência da minha comodidade, uma coisa, um objecto, uma cativa. Eu o dono, tu a serva, até hoje me tratas de senhor. Fui tão ruim para ti quanto o capitão. Um outro capitão, Tereza, envernizado, passado a limpo, mas no fundo, a mesma coisa. Emiliano Guedes e Justiniano Duarte da Rosa, iguais, Tereza.

- Ah! não se compare com ele! Nunca houve dois homens tão diferentes. Não me ofenda se ofendendo dessa maneira. Se fossem iguais porque estaria eu aqui, porque havia de chorar por sua gente se não choro nem por mim? Não se compare, que me ofende. Para mim o doutor sempre foi bom, me ensinou a ser mulher direita e a gostar de viver. (clik na imagem)

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