quinta-feira, maio 31, 2012


GABRIELA
CRAVO
E
CANELA

Episódio Nº 112



 - Meu Deus, os tabuleiros…

Arrumaram às pressas, os doces sobre o dos salgados, tudo na cabeça de Tuísca, que saíu assobiando a melodia. Os pés de Gabriela ainda traçaram uns passos, dançar era bom.
Um ruído de fervura veio da cozinha: ela precipitou-se.

Quando sentiu Chico Moleza entrar na casa ao lado, já estava pronta, tomou da marmita, enfiou os chinelos dirigiu-se para a porta. Ia levar a comida de Nacib, ajudar enquanto o empregado não estava. Voltou, porém, colheu uma rosa no canteiro do quintal, enfiou o talo atrás da orelha, sentia as pétalas aveludadas a tocar-lhe de leve a face.

Fora o sapateiro Felipe – boca suja de anarquista a praguejar contra os padres, tão educado quanto um nobre espanhol ao falar com uma dama – quem lhe ensinara aquela moda. «A mais famosa das modas», dissera-lhe.

Todas as muchachas em Madrid usam uma flor roxa nos cabelos…

Tantos anos em Ihéus, batendo sola e ainda misturava palavras castelhanas ao seu português. Antes aparecia no bar apenas de raro em raro. Trabalhava muito, remendando selas, arreios, fabricando chicotes de montaria, botando sola em sapatos e botas, no tempo livre lia folhetos de capa encarnada, discutia na Papelaria Modelo.

Quase só aos Domingos vinha ao bar para jogar gamão e damas, adversário temido. Actualmente era todos os dias, antes do almoço, na hora do aperitivo.

Quando Gabriela chegava, o espanhol suspendia a cabeça de rebeldes cabelos brancos, ria com os dentes perfeitos de jovem.

 - Salve la gracia, olé.

E fazia com os dedos um ruído de castanholas.

Outros também, fregueses anteriormente acidentais, haviam-se tornado quotidianos, O Vesúvio conhecia uma singular prosperidade. A fama dos salgados e doces de Gabriela circulara, desde os primeiros dias, entre os viciados do aperitivo, trazendo gente dos bares do porto alarmando Plínio Araçá, o dono do Pinga de Ouro, Nhô-Galo, Tonico Bastos, o Capitão, cada um por sua vez, haviam partilhado o almoço de Nacib, saíam dizendo maravilhas da comida.

Seus acarajés, as fritadas envoltas em folha de bananeira, os bolinhos de carne, picantes, eram cantados em prosa e verso – em verso porque o Professor Josué a eles dedicara uma quadra, onde rimara «frigideira» com «abrideira», «cozinheira» com «faceira».

Mundinho Falcão já a solicitara por empréstimo, um dia, quando ofereceu um jantar em sua residência por ocasião da acidental passagem por Ilhéus, num Ita, de um amigo seu, senador por Alagoas.

Vinham para o aperitivo, o pocker de dados, acarajés apimentados, bolinhos, salgados de bacalhau a abrir o apetite. O número crescendo, uns trazendo outros, devido às notícias sobre a alta qualidade do tempero de Gabriela.

Mas muitos deles demoravam-se agora um pouco mais além da hora habitual, atrasando o almoço. Desde que Gabriela passara a vir ao bar com a marmita de Nacib.
Click na imagem. O autor, o grande Jorge Amado, o tal que nasceu com uma estrela, como dizia a mãe, e Sónia Braga, a "nossa" Gabriela)

Site Meter