Episódio Nº 94
Sinhàzinha e Osmundo não veriam os
rebocadores e dragas no porto, cavando a barra. Não veriam esses dias de tanto
progresso sobre os quais Mundinho falava. Esse mundo é assim, feito de alegrias
e tristezas.
Contornou a Igreja, continuou a subir
vagarosamente a ladeira. Será mesmo que Tonico Bastos havia dormido com
Sinhàzinha? Ou era conversa para impressionar?
Nhô-Galo afirmava que ele mentia
descaradamente. Em geral ele não se metia com mulher casada. Rapariga, isso
sim, não respeitava dono. Sujeito de sorte. Também com aquela elegância, cabelo
prateado, a voz sussurrante. Bem que Nacib gostava de ser como ele, olhado com
desejo pelas mulheres, merecendo ciúmes violentos. Ser amado com loucura assim
como Lídia, rapariga do coronel Nicodemos, amava Tonico.
Mandava-lhe recados, atravessava ruas
para vê-lo, suspirava por ele que nem mais a ligava, farto de tanta devoção. Por
ele, Lídia arriscava todos os dias a sua situação, por um olhar, uma palavra
sua.
Rapariga, Tonico não respeitava de
ninguém, a não ser Glória, todos sabiam porquê. Mas com mulher casada não sabia
que ele se metesse.
Enfiou a chave na fechadura, arfando da
subida, a sala estava iluminada. Seria ladrão? Ou bem a nova empregada
esquecera de fechar a luz?
Entrou de mansinho e a viu dormida numa
cadeira, os cabelos longos espalhados nos ombros. Depois de lavados e
penteados, tinham-se transformado em cabeleira solta, negra, encaracolada.
Vestia trapos, mas limpos, certamente os da trouxa. Um rasgão na saia mostrava
um pedaço da coxa cor de canela, os seios desciam ou subiam lentamente ao ritmo
do sono, o rosto sorridente.
-
Meu Deus! – Nacib ficou parado sem acreditar. A espiá-la num espanto sem
limites, como tanta boniteza se escondera sob a poeira dos caminhos?
Caído o braço roliço, o rosto moreno
sorrindo no sono, ali, adormecida na cadeira, parecia um quadro. Quantos anos
teria? Corpo de mulher jovem, feições de menina.
-
Meu Deus, que coisa! – murmurou o árabe quase devotamente.
Ao som de sua voz, ela despertou,
amedrontada, mas logo sorriu e toda a sala pareceu sorrir com ela. Pôs-se de
pé, as mãos ajeitando os trapos que vestia, humilde e clara como um pouco de
luar.
-
Porque não deitou, não foi dormir? – tudo o Nacib acertou dizer.
-
O moço não disse nada…
-
Que moço?
-
O senhor… Já lavei roupa, arrumei a casa. Depois fiquei esperando, peguei no
sono – uma voz cantada de nordestina.
Dela vinha um perfume de cravo, dos
cabelos, talvez, quem sabe do cangote.
-
Você sabe mesmo cozinhar?
Luz e sombra em seu cabelo, os olhos
baixos, o pé direito alisando o soalho como se fosse sair a dançar.
-
Sei, sim senhor Trabalhei em casa de gente rica, me ensinaram. Até gosto de
cozinhar… - Sorriu e tudo sorriu com ela, até o árabe Nacib deixando-se cair
numa cadeira.
( Click na Imagem do Nacib que parece não acreditar na sorte que lhe saiu)
( Click na Imagem do Nacib que parece não acreditar na sorte que lhe saiu)
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