domingo, agosto 26, 2012


HOJE É 
DOMINGO
(Da minha cidade de Santarém)

Reconheço que interiorizei a crise em que o país vive e tal como um qualquer vírus ele entrou em mim, já não sou o mesmo. Sinto e reajo de maneira diferente embora, pessoalmente, não me deva queixar. É certo que já não conto com os meus subsídios de Férias e de Natal mas já há uns tempos me tinha percebido que eles estavam a mais na minha vida e a menos nas possibilidades do país. Por isso, há muito que os venho guardando…um dia, por este andar, o governo não vai poder pagá-los, temia eu...

Na quarta-feira passada, penúltima do mês, fui, como é hábito, a Lisboa almoçar com os meus colegas de curso – a minha neta chama-lhe o almoço dos velhotes - numa agradável viagem de comboio que a CP me serve por metade do preço atendendo que já passei dos sessenta e cinco anos. Os impostos dos meus concidadãos pagam a outra metade…

A meio da manhã, quando cheguei, a minha cidade natal estava linda e do lado esquerdo da estação dos comboios de Santa Apolónia, estavam atracados enormes e luxuosos paquetes de cruzeiros que já tinham despejado milhares de turistas muitos deles, acredito que a maior parte, visitavam Lisboa pela primeira vez.

O sol estava radioso mas de que valeria se ele não brilhasse naquele céu tão azul, naquela luminosidade ímpar tão rica e cheia de contrastes com o relevo da cidade, o encarnado vivo  dos telhados das casas e as águas verde-azuladas do estuário do Tejo?

Do alto do Parque Eduardo VII, deixando correr a vista por ali abaixo, desfrutava-se a mais linda cidade da Europa. Num primeiro plano, o verde e as flores do jardim ladeadas pelas calçadas que descem até à Rotunda em que o Marquês de Pombal é rei e senhor.

De um lado e do outro colinas, ou não fosse Lisboa a “cidade das sete colinas…”, mas o vale continua pela Av. da Liberdade, Praça dos Restauradores, Rossio, Rua do Ouro e finalmente abre-se, através do Arco da Rua Augusta, para o Largo do Terreiro do Paço, no centro do qual, D. José I, imponente, do alto do seu cavalo aceita a vassalagem que as águas do estuário do Tejo lhe prestam.

O trânsito estava entupido por causa das obras que decorriam na Rua da Ribeira das Naus, disse-me o motorista do táxi. Ainda bem, pensei eu: “haja alguém que dê trabalho mesmo que depois fiquemos pendurados no trânsito.” Noutros tempos teria pensado: “Que chatice, só obras, só obras…”

Chegado ao Rossio cruzei-me com autocarros descapotáveis carregados com turistas dos cruzeiros, cabecinhas loiras ao sol de Lisboa.

Diz Chris, prestes a regressar: “Passámos por Cannes, Barcelona, Málaga e esta é a melhor cidade.” Elogia as nossas muitas Igrejas, o “espírito relaxado das pessoas”, os “taxistas amigáveis” e o nosso vinho do Porto. “Vamos voltar em Dezembro”.

Que bem me sabe ouvir estes comentários. Estamos frágeis, sentimos o risco que o nosso futuro encerra e estas palavras são um alento, um estímulo, uma promessa velada de “estamos convosco”.

Foram 9.500 passageiros em viagem de cruzeiros de luxo que nesse dia nos visitaram e terão deixado cerca de 500.000 euros no comércio lisboeta mas, quase tão importante, foi a sua presença, as suas palavras.

Vivemos “demasiados” anos em segurança, acostumámo-nos a uma estabilidade que julgávamos para sempre mas que afinal apenas existia nos discursos de políticos enganadores e fraudulentos.

Mas esta bela Lisboa faz parte do nosso património perene, não é vendável nem penhorável, está a salvo. Pena, os prédios degradados, as janelas entaipadas, os vidros partidos, as pinturas destruídas e os graffitis de mau gosto. Se um dia mandasse em Lisboa com poderes discricionários proibiria a construção de novos prédios enquanto houvesse um, bastava um, que estivesse degradado porque aquilo que ofende a minha vista como sinal de desleixo e falência colectiva não passa despercebido aos nossos visitantes.

Entretanto, Cascais, a “capital” da linha do Estoril, a mais linda e extensa linha de costa de todo o litoral europeu, ponto de partida para uma visita a Sintra com o seu incomparável palácio e jardins, recebeu o Seven Seas Mariner, o primeiro de 11 cruzeiros de luxo que vêm à baía de Cascais até ao fim de 2013 num projecto vencedor de um concurso de ideias e negócios.

Percorrer a linha de costa de Lisboa a Cascais com um saltinho, mais à frente, à Boca do Inferno, era um dos passeios que em criança a minha família me proporcionava e de que fiquei admirador incondicional para o resto da vida.

(Click na imagem do painel de azulejos do antigo e desavtivado quartel de bombeiros, situado no centro da cidade e que aguarda melhores tempos para receber outro destino. Por enquanto, e desconfio que por muitos anos, vamos-nos revendo no velhinho painel de azulejos) 

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