CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 184
Armado de esplêndida
caradura, não se deixava derrotar nem em tais condições extremas. Voltava à
carga e quase sempre vencia: pelo menos um bilhete passava.
Os proventos de promotor
davam apenas, e magramente, para as necessidades da família numerosa, a vasta
filharada crescendo. Família numerosa, ou melhor: famílias numerosas, pois eram
pelo menos três. Sujeitava-se a pulso o eminente vate às leis escritas, boas
talvez para o comum dos mortais, mas inconfortáveis sem dúvida para os seres de
excepção como o «bacharéis» Argileu Palmeira.
Casamento e monogamia, por
exemplo. Como podia um verdadeiro poeta sujeitar-se a tais limitações? Jamais qui sera casar-se, apesar de viver há cerca de vinte
anos com a outrora saltitante augusta, hoje avelhantada, no que se pode chamar
de sua casa matriz.
Para ela escrevera os seus
dois primeiros livros: As Esmeraldas e os Diamantes (todos os seus livros
tinham como títulos pedras preciosas ou semi-preciosas), e ela em troca lhe dera
cinco robustos filhos.
Não pode um cultor de musas
cultuar uma única musa, um poeta necessita renovar suas fontes de inspiração.
Ele as renova denodadamente, mulher no seu caminho, virava logo soneto na cama.
Com outras duas musas inspiradoras produziu famílias e livros.
Para Raimunda, flor de
mulata adolescente e copeira, agora mãe de três filhos seus, burilou as
Turquesas e os Rubis. As Safiras e os Topázios deveram-se a Clementina, viúva
insatisfeita de seu estado, de quem nasceram Hércules e Afrodite.
É claro que, em todos esses
consagrados volumes, existiam rimas para outras musas menores. É possível,
também, existissem outros filhos além dos dez perfilhados, registados e
baptizados todos sob o nome de deuses e heróis gregos, para escândalo dos padres.
Dez vigorosos Palmeiras, de
variada idade, doze (porque aos ses dez somavam-se os dois do finado marido de
clementina) valentes bocas a sustentar, herdeiros do mitológico apetite do pai.
Eram eles, sobretudo – o gosto de mudar de paisagem, de ver terra nova – que
levavam o vate àquelas peregrinações literárias durante as férias forenses.
Com um stock de livros e uma
ou duas conferências na enorme mala negra sob a qual vergavam os ombros do mais
forte carregador.
Uma só? Não faça isso… Não
deixe de levar a madame. E os filhos que idade têm? Aos qui nze
anos já são sensíveis à influência da poesia e das ideias contidas em minha
conferência. Aliás, extremamente educativas, próprias para formar a alma dos
jovens.
- Não tem indecência nenhuma? Perguntava
Ribeirinho a lembrar-se das conferências de Leonardo Mota, que vinha a Ilhéus
uma vez por ano e obtinha casa superlotada, sem necessidade de passar bilhetes,
com suas palestras sobre o sertão. – Anedotas inconvenientes?
- Por quem me toma, meu caro amigo? A mais
rigorosa moralidade… Os sentimentos mais nobres.
- Não disse para criticar, até gosto. Para
falar a verdade, é mesmo as únicas conferências que suporto…
(Click na imagem. Será que estas belas jovens estão a dar à costa numa qualquer praia perdida?)
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