GABRIELA
CRAVO
E
CANELA
Episódio nº 188
-
Mas eu sou convidado e lhe convido. Esses almoços, meu caro, a gente não deve
perder. São sempre melhores que o trivial da casa. Sem falar na comida dos
hotéis, má e pouca, pouquíssima!
Quando saíram, Ribeirinho comentou:
-
Esse doutor duplo nem feito de encomenda… Vai arrecadando tudo: é entrada, é
livro, é almoço… Isso deve comer que nem jibóia…
É um dos maiores poetas da Baía –
afirmou Ari.
João Fulgêncio tirava do bolso o cartão
de visita:
-
O cartão de visita pelo menos é admirável. Jamais vi coisa igual. «Bacharéis»… Imaginem! Vive no Parnaso.
Perdoe-me, Ari, mas sem ter lido, não gosto da poesia dele. Não pode ser grande
coisa…
Josué folheava o exemplar de Topázios,
comprado pelo coronel Ribeirinho, lia versos em voz baixa:
-
Não tem fôlego, é um versinho anémico. E atrasado, como se a poesia não
houvesse evoluído. Hoje, no tempo do futurismo…
-
Não digam isso… É até um sacrilégio – Ari exaltava-se – Ouça, João Fulgêncio,
esse soneto. É divino, lia o título já em tom de declamação: - «O Ribombar da
Cachoeira».
E mais não pôde ler porque o espanhol
Filipe surgiu na sala, mal seguro nas pernas, tombando sobre as mesas, a voz
difícil:
-
Serraceno, burguês, súcio, donde está Gabriela? Que hiciste de mi flor roja, de
la gracia…
Agora era uma cabrocha jovem, aprendiza
de cozinheira, a portadora diária da marmita. Felipe, tropeçando nas cadeiras,
queria saber onde Nacib enterrara a graça, a alegria de Gabriela. Bico Fino
tentava levá-lo de volta ao reservado de pocker. Nacib fazia um gesto vago com
as mãos como a pedir desculpas, ninguém sabe se do estado de Felipe ou se da
ausência no bar da graça, da alegria, da flor de Gabriela.
Os demais olhavam em silêncio. Onde a
animação daqueles dias passados, quando ela vinha da hora do meio-dia, uma rosa
atrás da orelha? Sentiram o peso de sua ausência, como se bar sem ela perdesse
o calor a intimidade.
Tonico interrompeu o silêncio:
-
Sabem o título da conferência do poeta?
-
Não, qual é?
-
«Uma lágrima e a saudade».
-
Um xarope, vocês vão ver – prognosticou Ribeirinho.
(Parece que vem agora para aí uma nova telenovela da Gabriela... mas esta gente não sabe viver da saudade? Se é para a gente nova, aqueles que nunca viram e não conhecem porque não repôem a telenovela de 1975, com a Sónia Braga, a melhor telenovela que já passou na televisão? Comparem o sorriso e a expressão da Sónia Braga aos 25 anos com o da artista que vai agora fazer o papel dela e digam-me quem faz lembrar uma linda cabocla do sertão brasileiro? E os personagens do restante elenco?. Apenas uma vantagem: dar trabalho a outros artistas e a esse argumento eu sou sensível)
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