"Tonico Bastos, um inútil, só pensava em mulheres..." |
GABRIELA
CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 132
Amâncio ouvia, opunha
argumentos, deixava-se vencer. Orgulhoso daquele filho, aluno brilhante, com
notas altas nos exames:
- Quem sabe, tu tem razão, os tempos são
outros. Só que eu comecei junto com compadre Ramiro. Tu nem tinha nascido. A
gente correu perigo junto, eu era um rapaz, ele era um senhor. Junto a gente
derramou sangue, junto enriçou. Não vou largar ele nessa hora, o homem morrendo
cheio de desgosto.
- O senhor tem razão. Eu também tenho. Gosto
do padrinho mas, se eu votasse, não votava com ele.
Para Amâncio eram horas
felizes aquelas pela manhã cedinho, quando ia saindo para a banca de peixe e
Berto, o filho, vinha chegando da farra nocturna. Ficavam conversando. Seu
filho mais velho, tanto gosto lhe dava, aplicado aos estudos. Aproveitava para
lhe avisar, num conselho:
- Tu anda metido com mulher de Florêncio – um
coronel idoso que casara com fogosa filha de sírios, na Baía, ainda moça e dona
de imensos olhos langorosos. Entrando de noite em casa dele, pela porta do
fundo. Tem tanta mulher em Ilhéus, nos cabarés. Não te chega? Porque tu te mete
com mulher casada? Florêncio não nasceu para chifrudo. Se chega a saber… Não
tou com vontade de botar jagunço para te seguir. Acaba com isso, Berto. Tu me tira
o sossego. – Ria-se por dentro, era um danado seu filho, botando chifres no
pobre Florêncio.
- Não tenho culpa, meu pai ela estava me dando
linha demais. Não sou feito de pau. Mas fique tranqui lo,
ela vai viajar para a Baía, passar as festas. Afinal, meu pai quando é que vai
acabar em Ilhéus esse costume de matar mulher que engana marido? Nunca vi terra
assim!
A gente não pode se
esgueirar de uma casa, às quatro da madrugada, que logo se abrem todas as
janelas da rua para espiar.
Amâncio Leal fitava o filho
com seu olho são, cheio de ternura.
- Oposicionista de uma figa…
Invariavelmente, todos os
dias, visitava Ramiro. O velho comandava a campanha, apoiando-se nele e em
Melk, em Coriolano e poucos mais. Alfredo, aproveitando as férias da Câmara, viajava
pelo interior, visitava eleitores.
Tonico era um inútil, só
pensava em mulheres.
Amâncio ficava ouvindo Ramiro falar, dava-lhe notícias
animadoras, chegava a mentir. Sabia que as eleições estavam perdidas. Para
manter-se, Ramiro, ia depender do Governo, da degola dos adversários no
reconhecimento de poderes.
Mas nem queria que se
falasse nisso. Considerava seu prestígio inabalável, dizia que o povo estava
com ele. Como prova citava a mulher de Nacib, vindo de noite, afrontando a
cidade, salvar os seus nomes e o de Melk. Evitando aparecessem publicamente
envolvidos no processo do atentado a Aristóteles, o que sucederia na certa se o
negro fosse apanhado pelos jagunços. Sobretudo com aquela velhacaria do
Tribunal de Justiça designando um promotor especialmente para acompanhar o
processo.
- Pois eu acho, compadre,
que o negro morria e não falava. É um negro correcto, pena ter errado o tiro.
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