O cacau pode já ser carregados directamente para o seu destino |
GABRIELA
CRAVO
E
CANELA
Episódio Nº 180
Chão de Gabriela
Diversas vezes retardados,
terminaram por fim, os trabalhos da barra. Um novo canal, profundo e sem
desvios, fora estabelecido. Por ele podiam passar sem perigo de encalhe os
navios Lloyd, do Ita, da Baiana e, sobretudo, podiam entrar no porto de Ilhéus
os grandes cargueiros para receber directamente ali os sacos de cacau.
Como explicou o
engenheiro-chefe, a demora na conclusão das obras deveu-se a inúmeras
dificuldades e entraves. Não se referia aos barulhos cercando a chegada dos
rebocadores e técnicos, àquela noite de tiros e garrafadas no cabaré, às
ameaças de morte iniciais.
Aludia às inconstantes
areias da barra: com as marés, os ventos, os temporais, moviam-se elas, mudavam
o fundo das águas, cobriam e destruíam em poucas horas o trabalho de semanas.
Era preciso começar e recomeçar, pacientemente, mudando vinte vezes o traçado
do canal, buscando os pontos mais defendidos.
Chegaram os técnicos, em
determinado momento, a duvidar do sucesso, tomados de desânimo, enquanto a
gente mais pessimista da cidade repetia argumentos da campanha eleitoral: a
barra de Ilhéus era um problema insolúvel, não tinha jeito.
Partiram rebocadores e
dragas, os engenheiros e os técnicos. Uma das dragas ficou permanente no porto
para atender com presteza às movimentadas areias, para manter o canal aberto à
navegação de maior calado.
Uma grande festa de
despedida, cachaçada monumental, iniciando-se no Restaurante do Comércio,
terminando no Eldorado, celebrou o feito dos engenheiros, sua pertinácia, sua
capacidade profissional.
O Doutor esteve à altura
da sua fama no discurso de saudação, em que comparou o engenheiro – chefe a
Napoleão mas «um Napoleão das batalhas da paz e do progresso, vencedor do mar
aparentemente indomável, do rio traiçoeiro das areias inimigas da civilização,
dos ventos tenebrosos», podendo contemplar com orgulho, do alto do farol da
ilha de Pernambuco o porto de Ilhéus por ele «libertado da escravidão da barra,
aberto a todas as bandeiras, a todos os navios, pela inteligência e dedicação
dos nobres engenheiros e competentes técnicos».
Deixavam saudades e
raparigas. No cais de despedidas, choravam mulheres dos morros, abraçando os
marinheiros. Uma delas estava grávida. O homem prometia voltar. O engenheiro-chefe
levava preciosa carga da boa «Cana de Ilhéus», além de um macaco jupará para
recordar-lhe no Rio essa terra de dinheiro farto e fácil, de valentias e duro
trabalho.
Partindo eles quando
começavam as chuvas, pontuais naquele ano, caindo bem antes da festa de São
Jorge. Nas roças floriam os cacaueiros, milhares de árvores jovens davam os
seus primeiros frutos, anunciava-se ainda maior a nova safra, subiriam ainda
mais os preços, aumentaria o dinheiro a correr nas cidades e povoados, não
havia lavoura igual em todo o país.
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