sexta-feira, fevereiro 22, 2013


O PAÍS
DO
CARNAVAL

Episódio Nº 29

Rigger discordava:

- Só se deve cuidar da felicidade pessoal. No dia em que cada um for feliz a Humanidade o será… Esse negócio de sacrificar-se pelo bem-estar pelo bem-estar comum não vai comigo. E Pátria… Eu não tenho o sentido de Pátria. Só me senti brasileiro duas vezes. Uma no Carnaval, quando sambei na rua. Outra, quando surrei Julie, depois que ela me traiu.

 - Ticiano é quem tem razão. Naquele artigo de apresentação do “Estado da Bahia”, ele definiu bem a Pátria.

Ricardo lembrava-se.

Jerónimo recitou o trecho:

 - “A Pátria é o lugar onde o homem, pobre animal inferior, encontra com que se alimentar e onde dorme com uma mulher ou com outro homem conforme as suas predilecções.”

 - Isso mesmo!

 - Por sinal, o Gomes danara-se. Berrava que o jornal estava desmoralizado. José Lopes, a rir, só discordava do pedaço homossexual. E levaram o Gomes na troça.

 - Ora, eu nasci no Brasil. Mas a minha fornicação é toda francesa… O que sou devo-o à França. Qual é a minha Pátria? Numa guerra entre a França e o Brasil, por qual devo lutar?...

 - E o problema político – inquiriu Jerónimo – que acham dele? O movimento “fascista” é grande. A propaganda comunista enorme.

 - Eu não sou nem por um nem por outro. O Brasil não deve importar sistemas políticos. Nós até hoje temos importado tudo. Até uma constituição. Demo-nos bem com ela? Nós precisamos é nacionalizar tudo. Desde os sistemas de governo até às prostitutas… Nem comunismo nem fascismo… Nem polacas nem francesas… - explicava doutoralmente Ricardo.

 - Cuidado, Ricardo, esse rubi trás uma doença contagiosa. A retórica… Pois eu sou comunista… - e Rigger engasgou-se com um pedaço de carne.

Jerónimo não acreditava:

 - Comunista, você? Um aristocrata? “Comigo não, violão…”

 - Mas, Rigger, o comunismo é bonito em teoria… Na prática um fracasso. Igualdade, igualdade… Depois os operários que governam a surrar o povo… É isso o comunismo na prática.

 - Mas é exactamente por isso que eu sou comunista… O comunismo mandaria surrar os brasileiros três vezes por dia. O povo endireitava… No Brasil eu sou comunista prático. O único remédio eficaz para o brasileiro é o chicote…

 - Ah, ah, há! Você já está um novo Ticiano.

- Coitado do Ticiano, quase cego! E sempre a sorrir, superior da vida…

 - Eu às vezes penso que Ticiano tem razão. Que a nossa vida há-de ser um rosário de infelicidades, de desilusões… que a felicidade não foi feita pra gente…

 - …que a gente vive por viver… Pode ser. Mas eu não me quero convencer disso. Eu ainda espero…

 - Eu também – fez Rigger, baixando a cabeça sobre as mãos.

Site Meter