O PAÍS
DO
CARNAVAL
Episódio Nº 33
Compreendi e discordo. Tudo é muito pouco. A
filosofia, o conhecimento filosófico, sim, talvez console um pouco. Talvez
mesmo resolva o problema. Eu penso resolvê-lo assim…
- Que
filosofia, que nada! Só as coisas naturais, o amor, os instintos, a fé, o
trabalho podem nos satisfazer…
- Não. Só a
filosofia.
- Eu falhei
procurando-a no instinto, na carne – explicou Rigger – Sou capaz de procurá-la
no amor-sentimento. Chegarei até à religião… Só não irei à filosofia. A
filosofia deve fazer uma confusão horrível. Mostrar-nos-á cinquenta caminhos. E
cinquenta caminhos imprestáveis…
- Isso mesmo!
- E como você
poderá chegar à religião, sem a filosofia? Ao amor eu admito que você chegue
pelos sentidos. Mas, à religião?
- Chegarei pelo
sentimento. Sem ler tratados. Sem travar conhecimento com Maritain e São Tomás…
Serei católico, nunca tomista…
- Isto é
blague, Paulo. Você não chegará ao amor, quanto mais à religião! Você será um
Ticiano na vida. Sem coragem para realizar. Vivendo, existindo apenas…
- Não. Tentarei. José Lopes está irritado hoje. Por
quê?
- Não estou
irritado. Um bocado mais desiludido, somente. Já não acredito nem na
Serenidade… Ticiano diz que nós somos os “mendigos da Felicidade”…
- Tem razão, Para
mim. Ticiano resolveu o caso de nossa inqui etação,
da inqui etação de todo o mundo de
hoje e guarda avaramente o segredo… Ele não se preocupa com a vida… Feliz!
- Feliz nada! É
um céptico. Coloca-se sobre a vida. Faz-se espectador. Não vive. Comenta.
Ironiza. Satiriza. Destrói. Apenas. Isso não é felicidade. Ticiano acha que só
a dor é estética. Só a dor é bela. E como sobrepõe a beleza a todas as coisas,
ama a dor. Adora ser vencido. Gaba-se de ser um fracassado.
Escreveu no outro dia “A Balada Cinzenta da Minha
Vida”.
Um Voltairiano meio epicurista. Não. Epicurista, não.
Ele não sente mesmo alegria na vida. Sente indiferença… E ele garante que
ficaremos como ele. Às vezes, eu acredito. E fico como vocês viram hoje.
Contradigo as minhas próprias opiniões. Fico somente um disco a repetir o que
Pedro Ticiano desperdiça pelas mesas dos bares…
- É
interessante - notou Rigger – como nós combatemos Pedro Ticiano, apesar de ele
ser nosso mestre. Nós aprendemos com ele a indiferença e o cepticismo. Depois combatemos
esse cepticismo… Ticiano nota isso.
- Nota. Mas
ri-se da gente, sabendo que, por fim, nós veremos que ele tem razão…
- E afinal, nós devemos o que somos a ele, que, antes
de tudo, é amigo. Céptico, indiferente, mas amigo até ali.
- A norma da
vida de Ticiano é “saber ser amigo e saber ser inimigo”.
- José Lopes
lamentou-o. Quase cego, coitado! Que tragédia não sofreria aquele homem de
tanto talento, que terminaria sem poder sair de casa, sem poder ler… Uma coisa
horrível!
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