Episódio Nº 65
Lutador
A casa de Jubiabá era pequena mas
bonita. Ficava num centro de terreno no Morro do Capa Negro, um grande terreiro
na frente, um qui ntal se estendendo
nos fundos.
A sala espaçosa ocupava a maior parte da
casa. Uma mesa com um banco de cada lado, onde jantavam Jubiabá e as suas
visitas, e uma cadeira espreguiçadeira, virada para a porta do quarto em que
pai de santo dormia.
Nos bancos, em redor da mesa, negros e
negras conversavam. Estavam também dois espanhóis e um árabe. Nas paredes
retratos inúmeros emoldurados em conchas brancas e rosa, mostravam amigos e
parentes do pai de santo.
No nicho, um orixalá negro
confraternizava com um quadro do Senhor do Bonfim. O quadro representava o
santo salvando um navio do naufrágio. Porém o ídolo era muito mais bonito, pois
era uma negra de belo corpo, segurando com uma das mãos o seio pujante e bem
feito, num gesto de oferecimento. E era Iansan, deusa das águas, que os brancos
chamam santa Bárbara.
Jubiabá saíu do quarto, vestido num
lindo camisu bordado nos peitos. O camisu se estendia até aos pés e ele não
trazia outra roupa. Um negro se levantou da mesa e ajudou o pai de santo a se
sentar.
Os negros vieram e beijaram a mão de
Jubiabá. Também os espanhóis e o árabe. Um dos espanhóis estava com o queixo
inchado, um pano amarrado por baixo.
Chegou para perto de pai de santo e
disse:
-
Pai Jubiabá yo estou com um dente danado pra doer. Caramba! Não me deixa
trabajar, nem hacer nada. Caramba! Já gastei um dinheirão com o dentista e
nada… Não me resta nada a hacer!
Tirou o pano do queixo. Apareceu uma
inchação enorme. Jubiabá medicou.
-
Bote chá de malva e reze assim:
«São Nicodemos, sarai esse dente!
Nicodemos, sarai esse dente!
Sarai esse dente!
esse dente!
dente!
Completou:
-
Vosmecê faz a oração na praia. Escreve na areia e vai apagando de cada vez uma
palavra, não sabe? Depois vai pra casa e bota o chá. Mas sem a oração não
presta…
O espanhol deixou cinco mil réis e foi
aplicar o remédio.
Depois veio um negro que queria fazer um
despacho. Falou em voz baixa, próximo do ouvido de Jubiabá. O pai de santo se
levantou e ajudado pelo negro penetrou no quarto.
Voltaram minutos depois e no dia
seguinte apareceu um feitiço forte, farinha misturada com azeite de dendê,
quatro mil réis em pratas de dez tostões, dois vinténs de cobre, e um urubu
novinho ainda vivo, na porta de Henrique Padeiro que pegou uma doença
misteriosa e morreu dela tempos após. Uma negra também queria um feitiço, mas
esta não falou em voz baixa nem entrou para o quarto.
Foi dizendo:
-
Aquela sem vergonha da Marta tomou meu homem. Eu quero que ele venha de novo
para casa. – A negra estava revoltada.
-
Eu tenho filhos, ela não tem…
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