quarta-feira, julho 31, 2013


Os Terríveis AVC(s)

Às vezes, mais apetecia não ter amigos quando, num qualquer momento da nossa rotina diária, somos confrontados com a terrível surpresa de ver alguém que nos foi próximo reduzido fisicamente daquela forma tão chocante como acontece com as vítimas dos Acidentes Vasculares Cerebrais.

Ontem, de manhã, como de costume, estava no Café que substituiu agora, em termos de rotina, o local de trabalho onde a secretária deu lugar à mesa onde tomo um demorado pequeno-almoço preenchido pela leitura do jornal.

A dado momento, algo me chamou a atenção e levantando a vista da leitura reparei num senhor de idade, careca, que tentava, de uma forma esforçada e balbuciante, cumprimentar alguém.

Quando me apercebi que era comigo baixei a cabeça para retribuir o cumprimento e rapidamente regressei à leitura do jornal mas de repente, como se um qualquer mecanismo dentro de mim tivesse sido activado, levantei-me, dirigi-me à pessoa em questão e também eu, de forma hesitante disse: mas… és o Arménio!

Envelhecido, com a voz entaramelada, o braço direito imobilizado o meu amigo estava quase irreconhecível e procurava, desesperadamente, que eu entendesse a sua explicação sobre o que lhe acontecera porque ele não tinha sido o culpado…aquilo terá acontecido durante uma operação que deveria ter ocorrido de uma forma normal, sem outras consequências e muito menos aquela que aparentemente nada tinham a ver com o assunto.

Isto soube eu pelo senhor que o acompanhava…mas que me interessavam as explicações perante aquela situação de um amigo que durante anos seguidos me tinha acompanhado na organização e montagem da Cooperativa Lar Scalabitano, para a concretização do maior investimento em habitação social na cidade de Santarém?

Procurei sossegá-lo, afirmar-lhe que tudo iria voltar ao normal, com o tempo, a ginástica de recuperação e a sua força de vontade mas, naquele momento, mandava a comoção e encostando a minha cabeça à dele não pude evitar que os olhos se marejassem de lágrimas…hoje, o Arménio, ontem o Victor, entre eles o Pita Soares e outros que não conheço mas com quem me cruzo na rua…

Aquele é o preço que muitos de nós estamos a pagar por uma vida que, aparentemente, julgávamos sem riscos ou, sabendo-os, nunca acreditámos que um dia seríamos nós a sofrer-lhes as consequências.

O sedentarismo, os cigarros, o stress, as análises que não se fizeram, os medicamentos preventivos que nunca se chegaram a tomar e aquele maldito sofá, tão cómodo quanto apelativo constituíram armadilhas que se foram somando umas às outras e a partir de certa altura a nossa vida entra num jogo de roleta russa em que nunca sabemos o momento em que o gatilho dispara a bala que nos há-de deixar naquele estado.

A vida do homem nunca decorreu sem riscos, eles são inerentes à nossa própria existência de seres vivos e, extremando as coisas, quase que poderíamos até dizer que nascemos para correr riscos e, em todo esse processo, os mais avisados, os mais hábeis, os mais fortes e, principalmente, os mais afortunados, morrem mais tarde que os outros.

No caso concreto dos AVC(s) o que se pede às pessoas é que, especialmente a partir de uma certa idade, vigiem o seu corpo e tal como fazem com o automóvel submetam-no a revisões periódicas, que raio, ele não é menos importante que o carro e da mesma forma que falam com os mecânicos na oficina conversem igualmente com os médicos e sigam os seus conselhos, afinal para que servirá depois o automóvel se não podermos voltar a ter o prazer de o conduzir?

A vida e a saúde não estarão nas nossas mãos, acredito, mas será que não poderíamos ter feito mais qualquer coisita?

E quando não o fizermos por nós por quem o iremos fazer?

Para incapacidade já basta aquela que a velhice quase diariamente, com pezinhos de lã, sorrateiramente, lá nos vai acrescentando.

Cuidem-se!

Hoje, foi o Pereira com quem trabalhei durante muitos anos. Encontrei-o quando fui ao Multibanco com a minha neta. Lá vinha ele, muito mais magro, completamente embranquecido, não sei quantos anos mais velho e, no entanto, dois ou três meses depois da última vez que o vi...

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