Episódio Nº 108
Não, não fará fogo que
isso chamaria a atenção dos homens que estão na estrada a tocaiá-lo. Lembra-se
então de ver se ficaram muitos. Toca a mão no rosto que cada vez dói mais. Está
feio aqui lo. Com certeza era espinho
venenoso.
Pai Jubiabá sabe remédios
milagrosos para feridas assim. São folhas, folhas do mato. Ali deve ter destas
folhas. Ele olha o chão. Mas quais servirão. Só pai Jubiabá sabe, que ele sabe
tudo… Chega perto do mato que o separa da picada. Espia. Lá estão os homens.
Estão todos, nenhum foi
trabalhar… O patrão está mesmo disposto a liqui dar
o negro António Balduíno. Deu folga aos trabalhadores. Eles comem carne seca e
conversam.
António Balduíno volta
devagar. Botou a navalha no cinto novamente. Vai pensativo mas de repente ri:
- Comigo não levam vantagem…
O pior é não ter o que
comer. E de noite ficar sozinho. Ele nunca teve medo de ficar sozinho. Mas hoje
ele não quer. Fica pensando besteiras, vendo os mortos conhecidos, vendo pai
Jubiabá, os lugares por onde andou e vendo Lindinalva.
Se ele não visse
Lindinalva não tinha nada. Fica também pensando em Arminda que deve estar
amigada com o negro Filomeno. Mas o negro não tem culpa. Se ele não ficar com
Arminda outro qualquer ficará.
Não há mulheres nas plantações
de fumo. Por isso é que Ricardo agitava tanto o girau durante as noites. Como
se arranjará ele agora que não tem mãos. Vive em Cachoeira pedindo esmolas.
Terá mulher? Quem sabe se
não terá uma que trate dele… Ele bem que merecia, era um mulato bom, camarada
para tudo… Se estivesse na fazendo estaria cercando António Balduíno?
Tem uma névoa em frente
aos seus olhos. Isso é fome, ele já ouviu dizer. E sai desesperado em busca de
comida…
Quando a noite chegou ele
fumava o último cigarro e quase não via na frente dos olhos. O rosto inchado
doía de enlouquecer.
Anda para o lado das poças
d’água cambaleando como um bêbado. Está com o almoço da véspera, pois nem havia
jantado na hora da briga. Vai cambaleando e vão com ele muitos conhecidos.
Onde foi que ele já viu
aquele homem magro que está gritando:
- Quedê Baldo, o derrubador de brancos?
Está gritando e está
rindo. Onde foi que ele o viu? Agora se recorda. Foi naquela luta de boxe
contra um alemão que ele batera. Sorri. Já uma vez aquele homem dissera isso e
no entanto ele vencera o branco, o deixara estendido no tablado.
Poderá atravessar o cerco
também e alcançar a liberdade. Mas porque é que o Gordo está rezando oração de
defunto? Ele não morreu ainda… Por que então todos respondem :
«Orai por ele…»
Por que respondem? Não
vêem que aqui lo faz mal ao negro
António Balduíno que está com fome e traz no rosto um talho feio onde os mosqui tos pousam? Continuam. António Balduíno deitou
junto de uma poça d’água. Bebeu. Depois ficou olhando o cortejo que o
acompanha. Estende as mãos. Está pedindo que eles se afastem, que o deixem
morrer em paz:
- Vão embora! Vão embora!
<< Home