TRATA A MULHER
Um Relato Muito Escandaloso
Conhecem, com certeza, o relato do Novo Testamento do
encontro entre Jesus e a jovem adúltera que embaraçou a doutrina da Igreja a
tal ponto que, dos quatro Evangelhos, só aparece no de João e mesmo neste, não
em todos os manuscritos.
Alguns
especialistas nesta matéria explicam esta supressão nos restantes Evangelhos
porque a posição de Jesus perante a “pecadora”, a sua flexibilidade, o seu
desafio à lei religiosa que ordenava o apedrejamento, foi considerada excessiva
e até escandalosa para as primeiras comunidades judaico-cristãs, educadas numa
cultura discriminadora das mulheres.
A
violência contra as mulheres tem as suas raízes mais profundas nas religiões
patriarcais e o Judaísmo do tempo de Jesus era totalmente patriarcal. Por isso,
a atitude de Jesus para com as mulheres resultaram num escândalo. Não
esqueçamos que, etimologicamente, a palavra “escândalo” significa a “pedra em
que se tropeça”.
Jesus terá ensinado a igualdade entre as pessoas e, logicamente, entre homens e
mulheres, mas à época estas ideias eram demasiado avançadas e portanto as
desigualdades prevaleceram.
Lembremo-nos que a força da tradição judaica era
muito forte neste capítulo. Para se perceber da força dessa tradição eles
rezavam diariamente uma oração que dizia assim:
- “Bendito sejas, Senhor, por me
teres feito judeu e não gentio, por me teres feito livre e não escravo, por me
fazeres homem e não mulher.”
Actualmente, o cristianismo continua a
descriminar as mulheres mesmo quando faz de forma elogiosa. Para se perceber
essa descriminação na Igreja Católica, o Papa Bento XVI, em 2004, então Cardeal
Ratzinger, na qualidade de Perfeito da Doutrina e da Fé, sob o pretensioso
título “Carta aos Bispos da Igreja Católica sobre a colaboração do homem e da
mulher na igreja e no mundo” dizia o seguinte referindo-se à mulher:
- “É ela que, nas situações mais
desesperadas, possui uma capacidade única para resistir às adversidades de
tornar a vida, todavia, possível, incluindo em situações extremas, conservando
um tenaz sentido do futuro e, por último, de recordar com lágrimas o preço de
dar a vida humana.”
Como
se vê, nem uma palavra ou uma linha de reflexão ou condenação à violência
contra as mulheres, um tema que é hoje objecto de preocupação, debate,
investigação e acção em todo o mundo. Em vez disso, o Papa ressaltou o papel da
mulher na sociedade actual como suporte do sofrimento à custa da sua própria
vida e de aguentar sem desesperar… ou seja, as mulheres devem continuar a
suportar em silêncio a violência contra elas. Em vez de denunciar, devem
aguentar, em vez de libertarem-se, devem ter paciência.
- Como todos os seres humanos, Jesus foi filho
do seu tempo e do seu meio. O seu país, estava então submerso numa cultura e
costumes patriarcais profundamente discriminatórios das mulheres e uma das suas
grandes originalidades, de todas a maior, foi a de revoltar-se contra essa
cultura que ofendia a sua sensibilidade e sentido de justiça.
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